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domingo, 19 de outubro de 2025

Regressemos às origens da Europa

 




1. A islamização da Europa é, sem dúvida, uma ameaça. Hoje, vários países da Europa sentem já os perigos da islamização: bairros inteiros onde a autoridade do Estado não entra, onde reina a Sharia, ou seja, onde os direitos das mulheres não existem, nem as mais básicas liberdades.

É evidente que o Islão tem variadíssimas correntes, algumas das quais vivem em paz com a sociedade ocidental. Mas não é menos verdade de que há uma grande corrente do Islão que tem uma visão da sociedade, onde a lei civil está submetida à lei religiosa. E também não são poucos os que consideram a civilização ocidental como um inimigo, e que defendem o uso da violência para submeter os infiéis.

A Europa tem muita culpa neste crescendo da islamização. Não apenas pela evidentemente desastrosa política de portas abertas na imigração, mas também porque durante décadas, no seu desejo suicida de se livrar do cristianismo, escolheu o islamismo como aliado. Pensemos em coisas tão simples como a necessidade de assinalar publicamente qualquer festejo islâmico, enquanto se ignoram as festividades cristãs.

Em Portugal não temos o mesmo problema que o resto da Europa. Durante décadas a nossa comunidade islâmica era constituída maioritariamente por moçambicanos e guineenses. Ao contrário do que acontece, por exemplo, em França, por cá a nossa comunidade esteve sempre cultural e socialmente integrada.

Nos últimos anos, devido à política de portas abertas da imigração, esta realidade começou a mudar. Entraram em Portugal milhares de imigrantes muçulmanos de países que não têm qualquer relação connosco, e com uma visão muito mais extremista do Islão, que nada tem a ver com a comunidade islâmica que até então havia em Portugal.

É verdade que ainda não vivemos os mesmos problemas que vemos no resto da Europa, mas seria loucura ignorar os riscos que esta nova vaga de imigração coloca. Seria seguir o caminho da Alemanha, de França, da Bélgica, de Espanha e de vários outros países europeus.

2. Se é verdade que a islamização é um risco para a Europa, não é o único, nem sequer o mais grave. Porque a islamização não é a causa da decadência da nossa civilização, mas apenas uma das suas consequências.

O suicídio da Europa é fruto da negação do cristianismo, que é a sua origem. A Europa não é, geograficamente falando, um continente, mas apenas uma continuação da Ásia. O que separa a Europa da Ásia não são os Urais, nem o Bósforo, mas o cristianismo.

Foi o cristianismo que criou a cultura que uniu a Europa. O personalismo cristão está na origem dos Direitos Humanos, a Fé num Deus razoável está na origem da revolução científica.

Desde a Revolução Francesa, a Europa vive em guerra consigo mesma, procurando apagar qualquer traço da presença cristã. Este impulso já teve várias correntes, algumas vezes conflitantes entre si: liberalismo, marxismo, republicanismo laicista, nazismo, etc. Hoje revela-se, sobretudo, naquilo a que chamamos o wokismo.

O maior perigo que hoje enfrentamos na Europa é o ataque à liberdade que esta cultura procura impor. Esta mentalidade laicista, na sua actual versão, procura declarar que a sua ideologia é a Verdade, e que por isso qualquer tentativa de a negar é uma heresia.

Assistimos por toda a Europa a ataques constantes à Liberdade da Igreja, à liberdade de religião, de pensamento, de educação. Hoje, em boa parte da Europa, afirmar que um homem vestido de mulher é um homem, ou que a vida começa na concepção, ou até mesmo que nem todas as culturas são igualmente válidas, é visto como extremista, e, portanto, tendencialmente ilegal.

3. Quem criou o problema, não pode ser a solução. Por esse motivo é que, mesmo conhecendo os perigos do islamismo, recuso a utilização dos métodos do laicismo para enfrentar o problema.

A solução para a islamização da Europa não estará seguramente em dar ao Estado poder para declarar o que cada um pode vestir. Porque o Estado que declara que o uso da burca é uma submissão degradante da mulher à religião, é o mesmo que afirma que tem poder para decidir o que é um Homem e o que é uma Mulher.

Nós temos pouca memória, mas convinha lembrar que os mesmos ataques que foram ouvidos na Assembleia da República por causa da burca, são os que foram usados pelos políticos liberais para perseguir as congregações religiosas no século XIX.

Dirão que não há comparação entre o uso do hábito religioso e a burca, e eu concordo em absoluto. O problema é que o mesmo poder com que agora tantos cristãos se alinham para combater o extremismo islâmico, não concorda. E eu não estou disposto a entregar a Liberdade da Igreja ao bom senso desse poder. Seria saltar da frigideira para o fogo.

Significa isto que não devemos fazer nada quanto à ameaça do extremismo islâmico? Claro que não, há muitas coisas que podemos e devemos fazer. Restringir a imigração, fiscalizar mesquitas e madraças suspeitas de incentivar ao extremismo islâmico, expulsão dos estrangeiros que defendam o uso da violência contra os infiéis, proibir o financiamento de países conhecidos por apoiar o extremismo e o terrorismo islâmico, entre várias outras medidas.

Mas aquilo que não devemos, nem podemos fazer, é combater o extremismo islâmico usando a mesma mentalidade daqueles que hoje, por toda a Europa e no Ocidente em geral, procuram impor uma ditadura do pensamento único. Não estou disposto a sacrificar a minha liberdade de viver a Fé para combater este fenómeno.

4. Então qual é a solução? Como afirmei, na raiz do problema está a descristianização da Europa, pelo que a resposta é bastante evidente. O extremismo islâmico na Europa cresce no vazio cultural e espiritual em que vivemos.

O drama maior é que a Europa não tem nada a propor hoje que seja mais atraente que o fanatismo religioso. O que sobra hoje da cultura europeia? O consumismo, o hedonismo, o egoísmo e meia dúzia de frases feitas. Não é só o Islão que está mais extremista, é também a política. Os jovens procuram hoje desesperadamente algo que dê sentido à vida, para além do vazio da cultura moderna.

E a única resposta, a única resposta verdadeiramente Justa, verdadeiramente Bela, é Cristo.

Nos últimos dias, tenho visto um pouco por todo o lado a lista de países europeus que proibiram o uso da burca. E não posso deixar de me perguntar: e funcionou? Em algum desses países se travou a ascensão do islamismo radical? A resposta é bastante evidente: não.

Por isso, opor-me a leis tontas não significa não considerar a islamização da Europa uma ameaça. Significa simplesmente que não acredito que leis injustas e ineficazes resolvam o problema. Recuso-me a fazer o papel de idiota útil, que enche os pulmões contra o perigo islâmico, contra a cultura woke, e que depois abre caminho para outro qualquer tipo de opressão, que deseja, cheia de boa vontade, impor a sua visão do mundo a todos.

A única solução para a islamização da Europa, assim como para a cultura woke, é a recristianização. Isso não se faz através de projectos políticos e de poder, que no fundo acabam sempre vítimas da mesma mentalidade ideológica em que vivemos desde a queda da Bastilha.

O ponto fundamental para a recristianização da Europa é testemunhar Cristo vivo. Fazê-lo na sua vida pessoal, na sua vida social, na sua vida política. Não como projecto político, mas como desejo missionário. Foi assim há 1600 anos, quando Roma caiu, e um pequeno punhado de monges reconstruiu a Europa. Só poderá ser assim hoje, quando o novo império rui diante dos nossos olhos.

sexta-feira, 17 de outubro de 2025

Proibição da burca: uma lei inútil, perigosa e cobarde


 

Quem hoje andasse pelas redes sociais pensaria que havia em Portugal uma epidemia de mulheres de burca a assaltar bancos. Aparentemente, mulheres muçulmanas de rosto coberto são um enorme risco para a segurança, apesar de não haver qualquer dado que assim o indique.
A mim, por norma, incomoda-me que o Estado limite a liberdade pessoal, incluindo a liberdade de cada um se vestir como bem lhe apetece. Claro que percebo que todos os direitos têm os seus limites, e a liberdade de se vestir pode ceder diante do direito à segurança. Mas, para que isso aconteça, é preciso realmente estabelecer um grau sério de ameaça à segurança.


Há imensos comportamentos sociais que são potencialmente perigosos. E alguns são, de facto, origem de vários actos de violência — basta pensar no álcool, por exemplo, responsável por tantos actos de violência. Contudo, ninguém defende que se proíba o álcool. Nem o automóvel, uma das principais causas de morte em Portugal, nem as comidas gordurosas ou açucaradas. Então, por que razão o potencial risco da burca é suficiente para a sua proibição?

Claro que a segurança é apenas uma das desculpas — e a mais fácil de vender — para esta proibição. A outra é a defesa da dignidade das mulheres. Ainda hoje Rui Rocha, no Parlamento, ao bom estilo de um Abranhos ou de um Gouvarinho, explicou a missão civilizadora do Estado. A sagrada liberdade dita que tudo o que Rui Rocha acha indigno da condição feminina deve ser proibido.

Não falo, como é evidente, dos casos em que as mulheres são obrigadas pelos homens a usar burca. Isso já era ilegal (e acho encantadora a candura destas pessoas que não percebem que o homem que impede a mulher de sair de casa de cara descoberta irá simplesmente passar a impedir que ela saia de casa, agora que isso é proibido). Mas, para quem hoje aprovou esta lei, mesmo que a mulher escolha livremente esconder a cara, isso significa uma submissão inqualificável à religião, que um Estado civilizado não pode aceitar.

Pelos vistos, não viola a dignidade da mulher vender o seu corpo na internet. O corpo da mulher ser tratado como um qualquer pedaço de mercadoria é, para os nossos deputados, uma expressão da sua liberdade. Insuportável mesmo é que queiram andar de cara tapada! Espero pelo dia em que um grupo de homens, tão magnânimo como os que hoje defenderam a dignidade da mulher submetida à religião, decrete o fim do uso do soutien ou a obrigação do biquíni na praia — tudo, evidentemente, em nome da dignidade das mulheres!

Tudo isto seria cómico, se não fosse perigoso. Basta ler a exposição de motivos do projecto de lei, ou ouvir o discurso de Rui Rocha hoje no Parlamento, para perceber a ameaça que esta lei pode representar. Num tempo em que o valor mais ameaçado no Ocidente é a Liberdade, acho sempre perigoso que um Parlamento invoque o poder do Estado para restringir a Liberdade Religiosa. “Libertar as mulheres da religião” é uma frase que devia ser bem conhecida dos católicos portugueses — afinal, foi essa uma das justificações dos liberais para acabar com as congregações, e dos republicanos para acabar com a liberdade da Igreja.

Por fim, bem conheço o argumento da ameaça islâmica. E reparem que não tenho dúvida sobre ela. Ainda André Ventura andava a fazer teses sobre a ameaça que o securitarismo representava para a liberdade dos islâmicos, já eu escrevia sobre o tema (foi, aliás, o tema do meu primeiro artigo no meu primeiro blogue). O problema é que a maior ameaça do islamismo é a ameaça que representa às liberdades pessoais, sobretudo à liberdade religiosa. Imitar o pior do extremismo islâmico para o combater não me parece bom exemplo. Sim, o extremismo islâmico é uma ameaça, mas o extremismo laicista também o é, como o comprovam a República Espanhola, a URSS ou a Revolução Francesa.

Por tudo isso, esta lei hoje aprovada na Assembleia da República (e foi aprovada por toda a direita, pelo que a malta que gosta de dizer que eu só embirro com o Chega pode ficar sossegada) é ridícula e perigosa. Ridícula, porque trata um problema que não existe — ou seja, a suposta ameaça da burca. Perigosa, porque concede ao Estado o direito de decidir o que as mulheres podem ou não vestir, e decide como podem ou não as pessoas praticar a sua religião.

Por fim, é uma lei cobarde: forte com os fracos e fraca com os fortes — quem promove o extremismo islâmico. Cortar relações com o Catar ou a Arábia Saudita, dois dos maiores patrocinadores do terrorismo islâmico, nem pensar. Oprimir ainda mais mulheres oprimidas, não há problema. É uma lei que serve para mostrar serviço, para fingir que alguma coisa está a ser feita, para alimentar a populaça. Uma lei feita à medida, que irá afectar mulheres especialmente fragilizadas, não libertará nenhuma, não trará mais segurança, mas permitirá aos partidos de direita fingir que estão a fazer alguma coisa.