Todos as mensagens anteriores a 7 de Janeiro de 2015 foram originalmente publicadas em www.samuraisdecristo.blogspot.com

quarta-feira, 29 de maio de 2019

O aborto não defende ninguém, só destrói - Rádio Renascença, 29/05/19

Henrique Raposo publicou na Rádio Renascença um artigo sobre a lei do Alabama. No artigo o autor faz a comparação entre o aborto nos casos de violação e incesto com o homicídio em legítima defesa. Diz o colunista que tanto num caso como no outro permite-se um mal para impedir um mal maior.

Compreendemos e acompanhamos o autor quando defende que a violação e o incesto são dois crimes onde ninguém que não tenha passado por eles pode começar sequer imaginar o horror e o drama da vítima.

Já não conseguimos acompanhar o pensamento do autor quando ele afirma que a injustiça cometida contra a mulher justifica que se cometa uma outra injustiça contra uma vida gerada por esses crimes.

O Código Penal define assim a legítima defesa no seu artigo 32º “Constitui legítima defesa o facto praticado como meio necessário para repelir a agressão actual e ilícita de interesses juridicamente protegidos do agente ou de terceiro.” Ora a gravidez não é uma agressão. A agressão é a violação. Abortar não repele qualquer agressão nem impede qualquer acto ilícito.

Tentar justificar o aborto com a legítima defesa é afirmar (embora não duvide que o autor o faça sem intenção) que a criança que está dentro do ventre materno está a agredir a mãe. Posto assim, pensamos que a evocação da legítima defesa por Henrique Raposo para defender o aborto nos casos de violação e incesto parte do seu desconhecimento do que é realmente a legítima defesa e os seus pressupostos para afastar a ilicitude de uma conduta.

Contudo não queremos ficar pela simples refutação baseada no desconhecimento jurídico de Henrique Raposo (que aliás, volta a demonstrá-lo quando diz que estas eram a únicas excepções da lei do aborto de 1984 o que não é verdade).

A questão central é perceber se a lei pode obrigar uma mulher que ficou grávida por violação (do seu corpo e da sua vontade) a levar a gestação até ao fim.

E a resposta depende da forma como olhamos para a vida por nascer. O erro de Henrique Raposo é que olha para aquela vida como um mal, como um ataque à mulher. Para o colunista uma vida gerada por uma injustiça é cúmplice dos pecados do seu pai e por isso é licito destruí-la.

Ora um filho não é responsável pelos pecados do pai. Uma criança não necessita de menos amor ou protecção por ser filha de um criminoso. Não perde protecção porque o seu pai praticou actos inomináveis e abomináveis. Como recentemente afirmou o Papa Francisco “É justo contratar um assassino profissional para resolver um problema? Não é justo. Não podemos eliminar um ser humano, mesmo que pequeno, para resolver um problema.”

Uma Vida é sempre um bem. Destruir esse bem é sempre um acto injusto. E um acto injusto não repara nenhuma injustiça, nem cura nenhuma ferida. A lei permite a morte em legítima defesa se essa for a única forma de evitar uma agressão que pode ser mortal. A lei não permite a morte como reparação por um acto injusto, ainda menos a morte por um acto injusto praticado por um terceiro.

A violência e a injustiça não se ultrapassam com mais violência e injustiça. O aborto nos casos de violação e incesto só trazem mais mal. E o mal não se cura com o mal, apenas com o bem.

António Pinheiro Torres, vice-presidente da Federação Portuguesa pela Vida

José Maria Seabra Duque, coordenador da Caminhada Pela Vida

quinta-feira, 23 de maio de 2019

Porque votarei CDS nas Europeias.




A campanha para as europeias tem sido miserável. Mais do que qualquer ideia para a Europa tem-se discutido as pequenas tricas nacionais. Ideias poucas ou nenhumas, tudo se resume à picardia do momento.

Muito disto é culpa de António Costa que, para esconder a mediocridade do seu candidato (seriamente, penso nunca ter visto nada tão mau em política) veio a terreno transformas estas eleições num teste ao governo, com a novela de má qualidade dos professores pelo meio. Como para o PS a política é narrativa (o que se torna possível com a total complacência da comunicação social), a campanha socialista vive da história que inventou sobre a sua própria governação.

Infelizmente os partidos da direita demonstram-se incapazes de deixar Costa a falar sozinho. Aceitam ir a jogo no tabuleiro completamente inclinado do PS e acabam derrotados no jogo em que Costa é mestre.

Aliás tem sido esse o grande problema do CDS, não apenas nas Europeias, mas desde o último congresso: em vez de apresentar as suas ideias e o belíssimo trabalho que tem feito, prefere entrar na batalha da narrativa socialista. Resultado: o que faz de bom (o trabalho no parlamento e as ideias que defende) ninguém sabe, o que faz mal (porque para brincar as narrativas é preciso uma capacidade de mentira e manipulação que o CDS felizmente não tem) não resulta.

O problema do CDS não é de substância, é de comunicação. Tem apostado numa comunicação contra o governo (que tem muito para criticar) mas sem promover as suas próprias ideias e sobretudo o trabalho que tem feito.

Como o problema é de comunicação e não de substância (ao contrário do PS que é todo comunicação e zero de substância) vale a pena votar no CDS.

Primeiro porque o CDS é o partido que realmente defende a centralidade da pessoa na política: defende a Vida, a liberdade de educação, menos e melhor Estado, mais liberdade económica, menos asfixia fiscal. Este ideal, da pessoa concreta, com todos a dignidade que lhe é própria, é essencial numa Europa cada vez mais centralizadora, mais ideológica, apostada em apagar a história do continente em prol de uma nova ideologia que procura impor contra a vontade dos povos.

Em segundo porque o CDS é europeísta, mas também patriótico. Defende a cooperação europeia, mas uma cooperação de Estados. O CDS defende uma Europa solidária e forte, construída por Estados que decidem colaborar entre si. E uma Europa que perceba que a diferença entre os Estados não é uma fraqueza mas uma força.

Em terceiro porque o CDS propõe uma política responsável para o problema da migração. Distinguido refugiados de migrantes. Acolhendo os primeiros sem dúvida, sujeitando os segundos às leis de emigração. É uma irresponsabilidade deixar o problema da migração aos partidos populistas, como se só houvesse duas possibilidades: fechar totalmente as fronteiras ou então abolir as fronteiras. O problema é complexo, merece uma resposta complexa, e como disse Nuno Melo, os partidos responsáveis têm que falar sobre o tema.

Em quarto lugar, porque Nuno Melo é um bom candidato, com provas dadas na Europa. É um conservador sem medo de o ser e sem pedir licença para o ser. Num tempo em que a direita tem cada vez mais medo de se assumir como tal, a frontalidade de Nuno Melo é muito importante. Para além disso tem Pedro Mota Soares como segundo da lista. Um homem que foi um belíssimo Ministro da Segurança Social, que claramente sabe o que é a subsidiariedade, que claramente defende um Estado que apoia mas não se substitui aos corpos intermédios da sociedade.

Poderia aqui falar do mérito das outras candidaturas, porque me parecem menos boas que a do CDS. Contudo, voto CDS por mérito próprio da candidatura, não contra os outros.

Por tudo isto não tenho dúvidas em votar CDS nas próximas eleições. Mesmo sabendo, e desejando, que melhore, é a melhor alternativa para o país (porque as eleições são europeias, mas tem impacto no país).

terça-feira, 21 de maio de 2019

Publicar a opinião dos partidos: um escândalo para a “democracia” - Observador










domingo, 19 de maio de 2019

A prudência do Patriarcado.



1. A missão da Igreja não é fazer política, mas salvar as almas. Não é construir um mundo mais justo, mas anunciar a Cristo, redentor do Homem. 

Contudo, na sua missão de salvar as almas a Igreja não pode deixar de anunciar a Verdade e de orientar o povo. Por isso, não fazendo política, a Igreja tem o dever de anunciar os critérios para uma sociedade justa e denunciar a injustiça. Cabe depois aos leigos fazer política, tendo em consideração os critérios que a Igreja anuncia. 

2. A Federação Portuguesa pela Vida tem lutado sempre pela defesa da vida, sobretudo dos ataques que tem sido alvo nos últimos anos. As chamadas medidas fracturantes procuram impor uma cultura onde a vida não tem valor por si mesma, mas está sujeita aos critérios decididos pela sociedade: se é mais ou menos desenvolvida, se é mais ou menos saudável, se é mais ou menos útil. 

A Federação defende que toda a Vida tem dignidade, que não pode ser eliminada, alugada, vendida. Contraria uma ideologia que tenta reduzir o Homem a uma construção social, uma política que usa a educação para doutrinar as crianças nesta cultura da morte. 

3. É neste contexto que a Federação publicou um quadro com a posição dos partidos sobre alguns temas ligados à defesa da vida. Os temas são essenciais: a vida por nascer, a oposição à eutanásia, a liberdade de educação, a rejeição da ideologia de género e a luta contra a prostituição. Quem defende a Vida não pode votar em quem não é a favor destes temas. Não vale a pena fingir que são questões menores ou indiferentes. Não são temas fracturantes, mas sim estruturantes de uma sociedade. Um sociedade que não respeita a Vida Humana é uma sociedade que não respeita mais nenhuma dos direitos que dela advêm. 

Evidentemente que estes temas não são os únicos para decidir o voto. São apenas aqueles que a Federação Portuguesa pela Vida considera mais essenciais. E por isso dá a conhecer a posição dos partidos sobre eles. 

4. A partilha do quadro pelo Patriarcado foi de facto imprudente. É evidente que todos os temas do quadro coincidem com temas defendidos pela Doutrina Social da Igreja. Mas a DSI vai bastante mais longe. 

A Federação tem uma agenda política própria, centrada sobretudo nos temas apresentados. Mas à Igreja não se pede uma agenda política, mas sim ensinamento. Por isso a Federação pode fazer uma campanha simples de comunicação política, a Igreja não. 

Quem olha para um quadro feito pela Federação sabe que aquilo representa a agenda pró-vida. Mas quem olha para um quadro partilhado pelo Patriarcado pensa que representa a posição da Igreja, mesmo que esteja claramente assinalado que o quadro é responsabilidade da Federação. 

E a Igreja não pode evidentemente apresentar uma coligação como o Basta sem referir que esta tem posições contrárias à Doutrina da Igreja. Se é verdade que a coligação respondeu que sim às questões da Federação (mesmo sabendo que integra o movimento D21 que publicamente defende o contrário), também é verdade que o Basta defende a prisão perpétua, a castração química e tem um discurso sobre as minorias e os refugiados que está longe daquilo que a Igreja ensina e que o Papa Francisco tanto tem falado. 

Por isso, mesmo sabendo que o quadro não é um apelo ao voto, mesmo sabendo que não é um apoio a qualquer partido, a prudência manda que a Igreja não deixe espaço para confusões. 

5. O Patriarcado esteve muito bem em chamar a atenção para Carta Pastoral "Um olhar sobre Portugal e a Europa à luz da doutrina social da Igreja". Lá estão os critérios paras ajudar os cristãos a decidir o seu voto em consciência. É essa a missão da Igreja: ensinar e esclarecer as consciências. 

6. A política cabe aos leigos. E é isso que fizeram e fazem tantos leigos (como eu) que estão empenhados na defesa da Vida. 

Querer passar para a Igreja a responsabilidade de fazer política é desresponsabilizar-nos do nosso papel enquanto católicos e cidadãos. A Igreja educa-nos nos critérios e urge-nos a trabalhar para a causa pública. Construir uma sociedade mais justa, onde a Vida seja respeitada, não é dever do Patriarcado, nem da Igreja, mas de cada cristão. 

N.B.: Evidentemente que este artigo é da minha inteira responsabilidade pessoal, não representado em momento algum a posição da Federação Portuguesa pela Vida. 

sexta-feira, 17 de maio de 2019

O Polígrafo disse a verdade sobre a Federação Portuguesa pela Vida?





O novo drama do momento são as notícias falsas, provincianamente apelidadas de “fake news”, uma realidade com milhares de anos, mas que serve como bom bode expiatório para a ascensão dos populismos (os de direita que são maus, não confundir com os de esquerda que aparentemente não têm mal nenhum).

Para combater a nova praga foi criado um site de verificação de factos (ou na linguagem contemporânea) “fact checking” de seu nome Polígrafo, que se apelida como “o primeiro jornal português de fact checking”.

O problema é que o Polígrafo muitas vezes mais do que verificar os factos, verifica apenas se a interpretação dos factos está de acordo com a sua interpretação. Isto tem sido evidente nas notícias relacionadas com o aborto.

Em Janeiro o Polígrafo sentenciava como “impreciso” a notícia de que o aborto era a maior causa de morte no mundo. Segundo os mesmo era impreciso porque a OMS não considerava o aborto uma causa de morte. Ou seja, os factos da notícia eram todos verdadeiros, mas havia outra interpretação dos factos. A notícia não foi considerada verdadeira, nem sequer brindada com a categoria “verdadeiro, mas”, simplesmente “impreciso”.

Mas pior ainda foi a notícia de 1 de Abril (aliás, lendo a noticia poderia pensar-se que era uma partida do dia das mentiras) onde o Polígrafo afirmava ser falso que no Estado de Nova Iorque se pode abortar até ao fim da gravidez. O Polígrafo considerava a notícia falsa porque se podia abortar até fim da gravidez mas só em alguns casos, sendo que nos restantes não se pode, mas também não é crime. Ou seja pode-se de facto abortar até ao fim da gravidez, mas o Polígrafo diz que é falso porque… Não se encontra qualquer razão a não ser mesmo sobrepor as convicções do Polígrafo à verdade.

Por fim o Polígrafo publicou ontem à notícia (hoje disponível em versão vídeo) “Eleições Europeias: Há partidos que são a favor ou contra a "vida por nascer"?” sobre o quadro feito pela Federação Portuguesa pela Vida, com a avaliação “Falso”.

Quais são os argumentos do Polígrafo para considerar o quadro falso?

Primeiro «A tabela baseia-se supostamente em perguntas que terão sido respondidas pelos candidatos dos partidos às eleições europeias, mas não só, como se depreende a partir de uma nota de rodapé (com letras de tamanho muito reduzido, quase imperceptível) que passamos a transcrever: "O quadro acima foi elaborado a partir das respostas recebidas das forças políticas pela Federação Portuguesa pela Vida, da análise das suas mais recentes intervenções e posições e dos programas apresentados para as eleições europeias"» Ora não se percebe o problema aqui levantado pelo Polígrafo: a legenda que informa que o quadro é feito a partir da análise das posições públicas dos partidos é a mesmíssima que fala das respostas ao inquérito. As duas informações são colocadas ao mesmo nível com o mesmo destaque.

Depois, diz o Polígrafo «O problema é que o manifesto eleitoral do PS não tem qualquer referência à "vida por nascer", nem à questão da interrupção voluntária da gravidez ou aborto (parece ser esse o significado da expressão "vida por nascer"). O mesmo se aplica ao manifesto eleitoral do BE e também ao manifesto eleitoral da Aliança, bem como no do PAN. Nas mais "recentes intervenções e posições" dos respetivos candidatos também não detectamos qualquer referência a essa matéria.« Pelos vistos o Polígrafo nem se deu ao trabalho de verificar todos os partidos, apenas algum (enfim, não abona a favor da isenção). Mas pior do que isso o Polígrafo demonstra um desconhecimento total da realidade política portuguesa. Pelos visto não conhece o posicionamento do Bloco e do PS sobre o aborto. Não conhece que a primeira medida do actual parlamento foi a revogação da Lei de apoio à Maternidade e Paternidade aprovada pelo PS, Bloco, PC, Verdes e PAN. Não a conhece a resolução sobre o aborto no SNS recentemente aprovada no Parlamento.

Contudo, apesar de todos este desconhecimentos dos factos, o Polígrafo não se coíbe de dizer «“Ou seja, a tabela difunde uma falsidade: as posições quanto à "vida por nascer" não se baseiam em respostas oficiais dos partidos ou candidatos (pelo menos dos três já confirmados pelo Polígrafo), nem nas "suas mais recentes intervenções e posições", nem sequer dos "programas apresentados para as eleições europeias".» O Polígrafo não falou com todos os partidos, o Polígrafo não foi estudar a posição dos partidos sobre o aborto, mas não tem qualquer problema em fazer acusações. Como se pode ver não se trata de verificação de factos, mas apenas de uma tentativa de linchamento público.

Podíamos pensar que isto já era suficiente. Mas a fúria ideológica do Polígrafo ainda não tinha terminado. Neste ponto já somava várias mentiras, mas não era suficiente. «Acresce a manipulação e desinformação inerentes à forma como se indica que os partidos são a favor ou contra a "vida por nascer". Ora, mesmo que um partido ou candidato seja a favor da não criminalização da interrupção voluntária da gravidez ou aborto, isso significa que é contra a "vida por nascer"? No limite, ser contra a "vida por nascer" até pode ser interpretado como ser contra a gravidez, ou a possibilidade de reprodução».

Primeiro alguém devia emprestar um manual de biologia aos jornalistas do Polígrafo: antes da gravidez não há vida, logo era preciso uma interpretação muitíssimo alargada para transformar ser contra a vida por nascer em ser contra a gravidez.

Depois, já que é supostamente especialistas em verificar factos o Polígrafo podia ter verificado que os partidos assinalados como contra a vida por nascer, não se limitaram a ser contra a “descriminalização” do aborto, aprovaram mesmo a sua legalização. Mas mais grave, no principio da legislatura, ao revogar a Lei de Apoio à Maternidade e Paternidade revogaram coisas como a consagração legal da não discriminação das mulheres grávidas, a protecção do nascituro, a inclusão do nascituro no agregado familiar para efeitos fiscais ou a criação de programas autárquicos de apoio à família. Claro que para verificar os factos o Polígrafo tinha que estar interessado na verdade e não apenas em desacreditar a Federação Portuguesa pela Vida.

Mais uma vez o Polígrafo, a coberto do seu manto de suposto guardião da verdade, manipulou os factos para promover a sua opinião sobre o aborto. Inventou um suposto critério, não o verificou, afirmou factos que não confirmou e investigou, para no fim chegar à conclusão que queria. Ou seja, o Polígrafo inventou mais uma “fake new”.

Avaliação ao Polígrafo:

FALSO.

sexta-feira, 10 de maio de 2019

Por uma Europa das Nações.


Comemoram-se ontem 69 anos da declaração Schuman. Com esta declaração deu-se inicio ao processo de construção europeia. Num tempo onde a União Europeia atravessa aquela que é provavelmente a sua maior crise é importante relembra não apenas esta declaração  mas também o seu contexto.

Durante séculos franceses e alemães tinham sido inimigos. Só entre 1870 e 1945 travaram três guerras. As guerras de 14-18 e de 39-45 tinham devastado os dois países.

A declaração Schuman introduziu na Europa uma novidade: depois de séculos do equilíbrio de poderes de Richelieu, depois da paz forçada por Wilson construída sobre a humilhação da Alemanha e do Império Austro-Húngaro, passados cinco anos de uma guerra mortal a França e a Alemanha propõem-se construir a paz e reconstruir a Europa num espírito de cooperação. E fazem-no pondo em comum precisamente as indústrias que tinham alimentado a guerra, o carvão e o aço. Nas palavras de Schuman: “A comunitarização das produções de carvão e de aço assegura imediatamente o estabelecimento de bases comuns de desenvolvimento económico, primeira etapa da federação europeia, e mudará o destino das regiões durante muito tempo condenadas ao fabrico de armas de guerra, das quais constituíram as mais constantes vítimas.”

Este esforço de ultrapassar uma relação de desconfiança entre as nações europeias para começar uma verdadeira relação de cooperação trouxe à Europa ocidental um dos maiores períodos de paz e estabilidade que esta conheceu em séculos.

A minha geração, que cresceu só conhecendo a paz e a estabilidade, não tem muitas vezes noção de que estas não são o estado normal da Europa, mas uma novidade. A verdade é que damos a paz como um dado adquirido.

Infelizmente a União Europeia também tem vindo cada vez mais a esquecer-se da razão pela qual foi fundada. A União já não quer apenas ser um meio para atingir um fim, a paz entre os povos da Europa, quer ser um fim em si mesma. A preocupação já não é a paz, mas sim rivalizar com os Estados Unidos, a China ou a Rússia. Já não um projecto de paz, mas de poder.  E para isso a União está disposta a aprofundar a integração, até contra a vontade dos povos europeus.

Por isso vemos uma burocracia europeia cada vez mais afastada dos cidadãos. Já não representantes das nações, mas representantes de uma entidade abstracta que ninguém a não ser os burocratas de Bruxelas reconhece ou deseja.

Um entidade abstracta que no seu desejo de construir uma nova Europa, faz tábua rasa da história europeia. Apagando não apenas as nossas diferenças culturais e históricas, mas até as nossas raízes comuns. A mais forte e mais ignorada das quais é o cristianismo. 

Entre o esquecimento dos horrores da guerra e o crescimento despótico do poder da União o sentimento anti-união tem vindo a crescer em todos os estados membros. A União Europeia atravessa hoje a sua maior crise e arrisca-se a ver os partidos anti-união (que não é o mesmo que ser anti-europeísta) a tornarem-se o maior grupo parlamentar do Parlamento Europeu. E perante isto consegue-se adivinhar qual será a reacção da Comissão Europeia: mais integração, mais integração, mais integração!

A União Europeia caminha para a sua destruição. E isso é mau. Será a destruição do esforço de Schuman, Adenauer e De Gasperi e tantos outros que permitiu construir uma paz como a Europa raramente conheceu.

É tempo de a União mudar rapidamente o seu rumo. Desistir das suas pretensões federalistas, uniformistas, que claramente não são desejadas pelos povos europeus. Voltar à Europa das nações de De Gaulle, nações com história e culturas diferentes, que cooperam entre si pela paz na Europa. Ou nas palavras de Margaret Tatcher: “Deixemos a Europa ser uma família de nações, compreendendo-se melhor, apreciando-se mais uns aos outros, fazendo mais unidos, mas saboreando a nossa identidade nacional não menos do que o nosso esforço comum europeu.” Por esta Europa vale a pena lutar.