Sexta-feira, dia 10, será debatido na Assembleia da República
o alargamento dos prazos do aborto. Aparentemente, como seria expectável dada a
constituição do parlamento, as iniciativas irão chumbar, como qualquer pessoa
que tenha dois olhos na cabeça conseguiria adivinhar.
A questão, é então por que razão se lembrou a esquerda de
vir agora fazer esta proposta? Porque não o fizeram nos nove anos que tiveram maioria
na AR? Se o PS está assim tão empenhado em garantir mais tempo para as mulheres
abortarem, por que razão não o fez nos dois anos que teve maioria absoluta? A
resposta é bastante simples, porque à esquerda em geral, e ao PS em particular,
não lhes interessa que esta proposta passe.
Não nos confundamos, claro que eles preferiam prazos maiores
para o aborto legal, mas o tema em si, interessa-lhes mais como bandeira
política, útil para se abanada conforme as necessidades da agenda, do que a sua
aplicação. Se tivessem proposto novos prazos para o aborto quando dispunham de
maioria para isso, o assunto teria acabado por ali. Assim fica disponível para
o reavivarem sempre que precisarem.
O timing destas propostas tem apenas duas finalidades. A
primeira é poder acusar o PSD e o CDS de se encostarem ao Chega. Aposto
convosco o que quiserem que depois da votação de sexta-feira estaremos dias a
ouvir esse discurso.
A segunda finalidade é desviar a atenção do estado em que a esquerda
deixou o SNS, criando um bode expiatório, que são os médicos. A lógica é
simples, as mulheres não abortam porque os médicos são maus e objectores
consciência. E em vez de discutirmos a falta de material, o estado decrépito do
SNS, a falta de pessoal, estaremos a discutir a culpa dos médicos que recusam
praticar abortos.
As mulheres que não conseguem abortar são para a esquerda
apenas uma bandeira para usar enquanto lhes foi útil. Como foram os emigrantes há
quinze, ou os habitantes da Cova da Moura há um mês, ou os transexuais há quatro
ou cinco meses. E depois o interesse passará e a esquerda deixará cair ao chão
estas pessoas, como o fez anteriormente, e passará para outras que lhes sejam
úteis para criar ondas de revolta e gerar mais manifestos (sempre assinados pelas
mesmas pessoas).
O problema é que as pessoas que eles usam como bandeira são
reais. E merecem respeito. E precisam de apoio. Mas isso à esquerda é
indiferente, porque assim que perdem o seu valor como bandeira, perdem qualquer
interesse que podiam despertar a esses partidos.
Por isso não nos deixemos enganar: o que se vai votar dia 10
não tem qualquer relação com as mulheres, ou com qualquer drama humano. É
apenas mais um oportunismo político daqueles que deixaram o país de rastos e
agora tentam encobrir o rasto criando novas polémicas todos os meses.
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