O
artigo 36º da Constituição dispõe que os pais têm o direito e o dever de educar
os seus filhos. O direito a educar os filhos é por isso um direito funcional,
ou seja, um direito dos pais que tem que ser exercido em função dos filhos,
devendo os pais educar os filhos da maneira que considerarem melhor. E deve por
isso o Estado, uma vez que é um direito garantido pela Constituição, dar
condições para que os pais possam cumprir esse dever.
Cabe assim aos pais escolher qual a melhor escola para os filhos. Se os pais considerarem
que a escola mais adequada para os filhos é uma privada, isso é um direito
deles. O
Estado pode considerar que não tem meios para apoiar essa escolha (e poderíamos
agora discutir o assunto, mas não é o tema deste artigo) e por isso deixar aos
pais todos os encargos dessa escolha. Assim é em Portugal onde um pai, porque só
tem oferta estatal longe, porque a escola estatal ao pé de casa não tem um bom
nível de ensino, porque prefere que o filho tenha uma educação mais religiosa,
porque enquanto pai e ao abrigo da Constituição considera que o melhor para o
seu filho é uma escola privada, está obrigado a pagar duas escolas: as dos
filhos do outros através do seus imposto e a escola do seu filho com o dinheiro
que lhe sobra.
O
que o Estado não pode fazer é dificultar aos pais esse direito de escolha.
Infelizmente é isso que vemos acontecer. O caso mais flagrante foi a guerra da
gerigonça às escolas com contrato de associação. Pela única razão da defesa
ideológica da escola estatal, o Estado acabou com dezenas de contratos de
associação, obrigando crianças a ir estudar para mais longe de casa e para
escolas com piores condições!
Mas
o novo Orçamento de Estado traz mais uma novidade na descriminação das famílias
que escolhem o ensino particular: os manuais
escolares para os estudantes até ao 12º ano serão gratuitos, mas só para os alunos das escolas estatais, deixando, incompreensivelmente, de fora os estudantes das escolas privadas.
Qual
é a diferença entre estudantes das escolas estatais e estudantes das escolas privadas?
Os pais das crianças das escolas privadas não pagam impostos como todos os
outros? Não tem que comprar manuais escolares como todos os outros? Então qual
o motivo que existe para o Estado pagar os manuais a uns e não a outros?
Este
apoio não é as escolas, é as famílias. Se é compreensível (mas discutível) a
diferença de apoios às escolas estatais e às escolas privadas, não é
compreensível a diferença de apoio às famílias, só porque umas exercem o seu
direito a educar os filhos da forma como lhes parece melhor.
Bem
sei que há a narrativa, ao nível da caixa de comentários dos jornais, de que os
das escolas privadas são ricos e podem pagar. Para começar é um disparate dizer
que quem escolhe escolas privadas é rico. Haverá com certeza muitos ricos que o
fazem, mas também há uma grande maioria que o faz com muitíssimos sacrifícios,
com apoio da família e até com bolsas dos próprios colégios. Claro que, mesmo
assim, há muitos portugueses que não tem essa escolha. Mas isso não torna quem
o pode em rico. Para além disso, se a questão fosse realmente o rendimento dos
pais, então seria simples criar regras para que este apoio fosse dirigido
apenas a quem dele precisa.
Mas
não, os manuais são grátis independentemente do rendimento da família, para
todos os estudantes do ensino do Estado até ao 12º ano. Ou seja, os pais que escolhem
uma escola privada, não só pagam duas vezes a escola, como vão agora pagar
também duplamente os manuais escolares.
A
exclusão dos estudantes do ensino privado da gratuitidade dos manuais escolares é
apenas uma medida ideológica, contra os pais que exercem o seu direito de
educar os filhos. Infelizmente em Portugal a liberdade de educar os filhos
continua, cada vez mais, apenas ao alcance daqueles que tem dinheiro para a
pagar!
N.B.:
Muito haveria para dizer sobre a medida da gratuitidade dos manuais escolares. O
Governo, diante do problema real do custo imenso dos ditos, devido ao cartel das editoras, em vez de criar mecanismos para impedir o cartel, decide antes tomar uma medida
que irá custar milhões ao Estado para continuar a alimentar o negócio das
editoras de livros escolares.
Pior
ainda, fa-lo de um modo (os famosos vales que paga tarde e a más horas) que
arrasa com as pequenas livrarias e favorece as grandes.
Tudo
isto subsidiado com o continuo aumento brutal de impostos indirectos, que
prejudicam mais gravemente aqueles que já não pagavam manuais escolares devido
ao seu baixo rendimento, mas que verão os preços dos produtos que compram
aumentar, para subsidiar os livros de quem tem mais dinheiro do que eles.
Assim
governa a gerigonça, não para o bem do país, para ganhar votos!
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