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segunda-feira, 28 de outubro de 2019

Referendo à eutanásia: uma hipótese para lutar.



As últimas eleições legislativas provocaram uma grande e grave mudança para o país. A esquerda reforçou a sua maioria, o PSD tem um grupo parlamentar inexperiente criado à imagem de Rui Rio e o CDS quase foi varrido do mapa.

Estas mudanças terão várias consequências, sendo o escancarara-se da porta à legalização da morte a pedido uma das principais.

O chumbo desta medida na última legislatura foi por uma unha negra. Foi fruto de muito trabalho e do cruzamento de várias circunstâncias. A oposição do PC, a posição firme do CDS, a intervenção de Cavaco Silva e Passos Coelho. Foi a única vez que se conseguiu o chumbo de uma medida fracturante com uma maioria de esquerda no Parlamento.

Infelizmente as circunstâncias mudaram. O PSD ficou reduzido a 79 deputados, o PC a 10 e o CDS a 5. Dos partidos novos só o Chega é contra a eutanásia. No PS, só ficou um dos dois deputados que votou contra. Na melhor das hipóteses são 95 votos contra a eutanásia. Provavelmente, considerando que Rui Rio é a favor da legalização da morte a pedido, 65 ou 70. Ou seja, a eutanásia será aprovada no Parlamento por uma maioria de 20 a 50 votos. Há votos suficientes não apenas para aprovar a eutanásia, mas também para ultrapassar um veto presidencial.

Evidentemente que o Bloco de Esquerda conhece estes números, por isso fez da legalização da eutanásia a sua primeira medida nesta legislatura. Podemos lutar o que quisermos, fazer as campanhas que quisermos, que o resultado em São Bento já está decidido. Haverá um simulacro de debate e depois uma aprovação sem espinhas.

Por isso temos duas opções: esperar a aprovação da lei ou tentar tirar a decisão de São Bento. E retirar a decisão do Parlamento significa pedir um referendo. O referendo é a única alternativa à legalização da eutanásia. Ou pelo menos, a única alternativa de lutarmos realmente contra tal injustiça.

Foi por isso que, na última Caminhada pela Vida, foi anunciada uma Iniciativa Popular de Referendo sobre o projecto-lei do Bloco. Isto significa apresentar ao Parlamento uma proposta de referendo sobre esse projecto, acompanhada por 60 mil assinaturas. Caberá depois ao Parlamento aprovar ou chumbar essa proposta.

Não se trata, como alguns dizem, de referendar a Vida. A Vida humana é inviolável, por isso nem a Assembleia da República, nem o povo têm legitimidade para legislar sobre ela. A Vida é um direito sobre o qual a lei não pode dispor.

Infelizmente é mesmo isso que os deputados se propõem fazer: aprovar uma lei que legaliza a morte de um doente quando este o pede. E o referendo é por isso apenas um instrumento para travar esta lei.

            A posição de que não se pode fazer um referendo para travar a legalização da eutanásia lembra a posição dos pacifistas que dizem que a guerra é sempre injusta. A guerra é má, mas se um exército invade um país e começa a trucidar inocentes, então a guerra não só é um meio legítimo, como é também uma obrigação para a defesa destes.

Negar o referendo poderá dar superioridade moral. Mas é a superioridade moral de quem está disposto a pagar com a vida dos outros a sua perfeição ideológica. É o farisaísmo do levita a caminho do templo, que não pára para ajudar um ferido na estrada para não ficar impuro.

Também há quem tema o referendo por temer as consequências da derrota. Sobretudo por temer que depois se torne mais difícil revogar uma lei que foi aprovada pelo povo. Mas a verdade é que nenhuma lei fracturante foi revogada no Parlamento português por uma maioria de direita. Aliás, não conheço nenhuma lei fracturante que tenha sido revogada por um Parlamento por esse mundo fora. Independentemente de ser uma lei aprovada por um tribunal, por um parlamento ou em referendo, a verdade é que a experiência demonstra que as leis fracturantes, uma vez aprovadas, dificilmente são revogadas. Por isso, este argumento, por muito lícito que seja, baseia-se numa premissa nunca verificada: que uma maioria conservadora há-de revogar essa lei. Basta olhar para Portugal, para Espanha, para a Bélgica ou para a Holanda, para verificar que tal nunca acontece.

Evidentemente, o referendo tem riscos. Mas não é apenas a única possibilidade de travar esta lei, é também a única possibilidade de retirar o debate da Assembleia da República e trazê-lo para a rua. A única possibilidade de fazer uma campanha para esclarecer as consciências sobre o que é a morte a pedido e as suas consequências. É a grande possibilidade de gritar a verdade diante da mentira da “morte digna”.  E é essencial uma verdadeira campanha contra a eutanásia, não uma luta táctica no Parlamento, com argumentos mais ou menos formais.

É fundamental voltar a afirmar sem rodeios que aquilo que está em discussão na eutanásia é se a doença torna legal matar uma pessoa. É essencial voltar a colocar a dignidade da Vida Humana no centro do debate público. A grande probabilidade de a morte a pedido se tornar legal torna ainda mais urgente que a sociedade participe neste processo.


Neste tema da morte a pedido não há uma escolha inteiramente boa ou fácil. Podemos escolher entre deixar passar a lei na Assembleia da República, com qualquer oposição a ser ignorada na comunicação social, ou tentar trazer a luta para a rua com o referendo. Resumido: podemos desistir ou continuar a lutar, mesmo que com baixa probabilidade de vitória. Eu quero continuar a lutar, porque acredito que a Vida de cada um dos que for vitima desta lei é um bem precioso pelo qual vale a pena ir à batalha. E por isso apoio o referendo.

terça-feira, 22 de outubro de 2019

Porque toda a Vida é digna - Observador, 22/10/19

Nos últimos dias tenho visto muitas pessoas a perguntar como é possível um médico deixar nascer uma criança sem olhos, nariz e alguns ossos na cabeça.

Evidentemente que nesta circunstância não podemos deixar de pensar, antes de mais, nos pais do Rodrigo. Esta hora só pode ser dramática para eles. Eles tinham o direito a conhecer a realidade do seu filho e a preparar-se para os desafios de um filho com deficiências tão profundas. A indignação diante de tal erro médico é justa, sobretudo ao saber-se que já antes o médico tinha tido vários processos disciplinares. É natural por isso que a sociedade se indigne em solidariedade para com os pais do Rodrigo.

Infelizmente parece que, mais do que a incapacidade do médico em questão de detectar má formações numa ecografia, o choque é por ter permitido que aquela  criança nascesse.
Vivemos num tempo em que uma criança deficiente é suposto não nascer. Sendo que não nascer é um eufemismo para matar essa criança na barriga da mãe. Um tempo onde a dignidade humana, e consequentemente a sua protecção jurídica, está dependente da ligação emocional que é capaz de suscitar.

É esta mentalidade, de relativização da dignidade Humana, que permite hoje discutir a legalização da morte a pedido. Assim como um bebé deficiente não deve nascer, um doente em fim de vida pode ser morto. Cada vez mais a vida é digna enquanto não der trabalho ou incómodo, enquanto emocionalmente me satisfizer. Perdeu-se a consciência de que cada Ser Humano é único e irrepetível. Que cada Ser Humano é, pela sua própria condição humana, digno, independente da sua circunstância.

E para quem eventualmente considerar que exagero, basta lembrar que um dos grande vencedores das eleições de dia 6 foi o PAN, cujo líder afirmou publicamente que “Há características mais humanas num chimpanzé ou num cão do que numa pessoa em coma”. Ou que o bloquista Bruno Maia, que ficou à porta do Parlamento nas últimas eleições, questionou na televisão nacional qual a dignidade de uma pessoa acamada.

E assim, esta mentalidade retrógrada, que considera que a Vida Humana só é digna quando a sociedade o diz, vai-se instalando. Lentamente voltámos aos tempos de Esparta, onde as crianças deficiente eram abandonadas à morte. Aos tempos das migrações dos povos germânicos para o Império Romano, onde os velhos e os doentes eram mortos para não atrapalharem. Aos tempos de Calígula, que fez do seu cavalo Incitatus cônsul, enquanto mandava matar qualquer pessoa de quem nãos gostava e prostituía as irmãs no palácio imperial. A mentalidade que dita a agenda fracturante, que se considera progressista, nada mais é do que um regresso à barbárie de um passado distante.
Por tudo isto é cada vez mais necessário voltar a afirmar publicamente aquilo que muitos julgávamos ser uma evidência: que a Vida Humana é intrinsecamente digna. A deficiência, a doença, as capacidades, a inteligência, não diminuem ou aumentam essa dignidade. E é triste que ainda seja preciso fazê-lo.

É para afirmar o valor da vida de todos os bebés, saudáveis ou não, de todos os doentes e idosos, para testemunhar que a vida é sempre digna, que a Caminhada pela Vida vai sair à rua no dia 26 de Outubro em Lisboa, Porto, Aveiro, Braga e Viseu. A esta cultura que concebe a Vida Humana como um valor ao dispor da sensibilidade social e do poder legislativo, é preciso responder publicamente relembrando que a nossa sociedade está fundada sobre o valor objectivo da Vida.

Todas as vidas são dignas. O que não é digno é a maneira como a sociedade tantas vezes trata os mais frágeis: os deficientes, os doentes, os idosos, os mais pobres. Caminhar em defesa da Vida não é simplesmente ser contra o aborto ou contra a eutanásia, é defender uma sociedade que cuida dos seus, que cuida especialmente dos que mais precisam. É defender mais apoio às grávidas em dificuldades, mais apoio às famílias com filhos deficientes, é defender os que cuidam dos doentes, é defender mais cuidados continuados, mais cuidados paliativos. Caminhar pela Vida é dar testemunho da sociedade que desejamos, uma sociedade que não mata, cuida.

quinta-feira, 17 de outubro de 2019

CDS mais ou menos à direita? Uma perda de tempo. - Público, 17/10/19

O novo desaire do PSD e do CDS trouxe consigo o regresso do debate sobre a Direita. Mais uma vez assistimos à discussão sobre o que é preciso mudar para que o Partido Socialista deixe de estar no poder excepto em alturas de crise.

Da parte do CDS este debate acaba sempre por cair na discussão sobre se o partido deve ser mais à direita ou se deve ser menos sectário, de maneira a facilitar uma grande coligação de centro-direita contra o PS. Invariavelmente o problema resume-se no quão à direita o CDS deve ser.

O problema é que ser de direita não quer dizer coisa nenhuma. Direita e esquerda são adjectivos surgidos na revolução francesa que descreviam onde se sentavam os mais conservadores e os mais progressistas na Assembleia Nacional. Desde então tem sido usado como forma simples de classificar os partidos e as doutrinas políticas. Mas em si mesmo, simplificando para efeitos do argumento, não querem dizer nada.

À esquerda o problema não se revela tanto pelo simples de facto que esta se identifica com o socialismo nas suas múltiplas variantes. Mas aquilo que habitualmente descrevemos como direita é um conjunto variado de doutrinas e ideologias políticas com raízes e propósitos diferentes.

Por isso ser “mais à direita” não quer dizer nada. Ser mais à direita pode significar um Estado mais autoritário, ou menos Estado. Pode significar mais europeísmo ou mais nacionalismo. Pode significar mais liberalismo económico ou mais regulação do Estado. Mais à direita significa coisas diferentes para um Liberal, um Conservador, um Democrata Cristão ou um nacionalista.

Mas pior do que querer ser mais à direita, no vácuo desta expressão, é querer que haja uma só direita. Uma só direita significa abandonar qualquer pensamento original das várias direitas, e unir-se em volta do combate à esquerda. No fundo é transformar a direita em apenas uma “contra-esquerda”.
Qualquer uma destas duas opiniões tem como consequência deixar as direitas ser definidas pela esquerda. Desistir de apresentar qualquer ideia original, mas simplesmente combater o socialismo. Ou seja, no fundo, é não propor uma alternativa ao pensamento da esquerda, mas simplesmente reagir a este.
O grande problema das direitas foi perderem a sua identidade. Para serem poder aceitaram a predominância cultural e social da esquerda, e limitaram-se a ser a governanta do país, que aparece para pôr as contas em ordem. E está tão afundada nesta mentalidade, que mesmo quando reage o faz meramente rejeitando as propostas da esquerda, mas sem qualquer capacidade de propor uma visão para o país que não seja a reacção à esquerda.

Este é o problema de centrar o debate sobre o futuro das direitas no ser mais ou menos à direita: tem sempre como condição prévia o quadro mental e cultural da esquerda.

Aquilo que o CDS precisa não é de ser mais ou menos à direita. Esse debate é fazer o jogo da esquerda. O que o CDS precisa é de ter uma identidade clara que se traduza numa proposta clara para o país. Não uma mera rejeição do socialismo, mas uma verdadeira alternativa a este.

Essa foi aliás a grande riqueza e contributo de Adelino Amaro da Costa e Diogo Freitas do Amaral para a democracia: num tempo onde todos os partidos tinham que ser socialistas, os fundadores do CDS tiveram a coragem de propor um partido personalista cristão, que tinha como centro a dignidade humana. Um partido que propunha um Estado ao serviço do Homem, em colaboração com os vários corpos sociais, que procurasse garantir a dignidade de cada homem respeitando as liberdades individuais, que defendia uma economia social, ou seja respeitando a liberdade económica, mas ao serviço da sociedade.

Os tempos mudaram e os desafios dos nossos dias são diferentes daqueles que enfrentaram Amaro da Costa e Freitas do Amaral. Mas parece-me que seria muito mais proveitoso para o CDS debater como tornar actual este ímpeto dos seus fundadores, de um partido verdadeiramente democrata-cristão, centrado na dignidade humana, que defende um Estado ao serviço do bem comum, do que na estéril discussão de quão de direita deve o partido ser.

O CDS só voltará a crescer quando recuperar a sua identidade. Discutir se esta identidade está mais à direita ou mais ao centro, se deve ser mais ou menos sectário é apenas desperdiçar tempo.

quinta-feira, 10 de outubro de 2019

Na Síria, mais uma vez o martírio.



Confesso que não sou especialista na complexa política do Próximo Oriente. Existe uma quantidade enorme de povos, de alianças, de movimentos políticos e religiosos, que não são fáceis acompanhar. Para além disso, a informação sobre a situação política nessa zona do globo chega-nos sempre pelo filtro do Ocidente, que tende a apresentar a situação sobre o prisma que é mais conveniente. Basta pensar na guerra civil da Síria, onde terroristas foram sempre tratados como se fossem democratas.

Dito isto, sempre tive alguma apreciação pelos curdos. Desde que me lembro de ouvir falar deste povo estavam regra geral a ser perseguidos por algum ditador ou grupo extremista sanguinário e a resistir.

Mas a minha admiração por este povo aumento sobretudo durante a guerra contra o Estado Islâmico. Lembro de a um certo ponto os curdos serem os únicos que pareciam realmente lutar contra o EI. Sobretudo, quando a perseguição aos cristãos começou no Iraque os curdos pareciam ser os únicos dispostos a lutar para os defender.

Na altura em que a Europa fazia jura de combate ao EI e o Estados Unidos lhes davam força enfraquecendo o governo Sírio, os curdos lutaram, e muitas vezes com sucesso contra esses bárbaros.

Enquanto escrevo estas linhas a Turquia está a atacar o nordeste da Síria, uma zona autónoma, nascida da guerra contra o Estado Islâmico, controlado por uma coligação de curdos, mas também de cristãos e árabes. A desculpa evidentemente é o ataque aos curdos. Erdogan, sem qualquer problema, está a bombardear civis e a usar jihadistas neste ataque. Entre os objectivos está o tomar posse das prisões onde se encontram dezenas de milhares combatentes do Estado Islâmico (que, relembremos, nunca teve grandes problemas com a Turquia). Tudo leva a querer que o ataque Turco não só será levará a mais atrocidades contra o povo sírio, como pode levar ao recomeço da guerra civil que martirizou e destruiu aquele país.

Tudo isto se passa com o consentimento tácito de Trump (que retirou os conselheiros militares americanos daquela zona, permitindo o avanço turco) e a bênção de Putin. Para todos aqueles que viam nestes dois os grandes defensores do Ocidente e da Cristandade contra o islamismo é bom que fique claro que os dois acabaram de entregar os maiores inimigos do Estado Islâmico a um ditador islâmico por mero interesse geo-estratégico. Trump demonstra assim que é igual a Bush e pouco melhor que Obama. Os aliados de hoje sãos os inimigos de amanhã, tudo dependente do interesse americano.

Mais uma vez o povo sírio, especialmente as suas minorias, serão vitimas no grande tabuleiro da geo-política mundial. A guerra de influências entre americanos, russos, iranianos, sauditas, judeus e árabes será mais uma vez paga com o sangue inocente dos sírios. Pouco ou nada podemos fazer. Mas podemos e devemos denunciar.

P.S.: Sobre o tema vale a pena ler a notícia da RR assinada pelo Filipe Avillez assim como ir seguindo o que ele escreve nas redes sociais sobre o tema.

segunda-feira, 7 de outubro de 2019

O CDS e o futuro: haja coragem!





O resultado das legislativas foi desastroso para o CDS. Infelizmente, foi um desastre anunciado, aconteceu apesar de todos os avisos de que o caminho que estava a ser percorrido não tinha bom fim.

No congresso de Lamego, a palavra de ordem foi o famoso pragmatismo. Desde então o CDS furtou-se a qualquer debate público de ideias e agarrou-se à fórmula de que era preciso apenas discutir “os problemas concretos das pessoas”. Apesar dos sinais das europeias, apesar do panorama europeu e mundial, onde era claro que, de facto, as pessoas queriam ideias e ideais, a direcção do partido decidiu manter a sua estratégia. A procura de um novo eleitorado que permitisse conquistar o centro-direita ditou que o partido guardasse as suas bandeiras (e defendeu tantas, corajosamente, no parlamento) e se limitasse a falar dos temas do dia-a-dia. O resultado da estratégia está à vista: não se ganhou nenhum novo eleitorado e o antigo está a esvair-se.

É evidente que Assunção Cristas tem responsabilidade nesta estratégia. E a ainda presidente do CDS assumiu-as com  dignidade na noite eleitoral. Mas não deixa de ser verdade que há outra cara desta linha, o primeiro a proclamar a necessidade do pragmatismo, autor do programa eleitoral e claramente um dos grandes estrategas da direcção: Adolfo Mesquita Nunes. A derrota de ontem é do CDS, é de Assunção Cristas, mas é também do seu principal ideólogo.

É impossível não reconhecer a capacidade política de Adolfo Mesquita Nunes. Um bom orador, um bom tribuno, responsável durante a crise por uma das pastas que mais alavancou a economia portuguesa. Mas nada disto pode afastar a evidência de que a sua estratégia conduziu o partido à pior votação de sempre.

Não basta por isso simplesmente mudar o líder do partido: é preciso claramente mudar o rumo. Nada seria pior do que trocar Assunção Cristas por um líder que vá simplesmente continuar a estratégia de, em nome do pragmatismo, diluir aquela que é matriz do partido: a democracia cristã.

É por isso preciso um novo rumo. Evidentemente, o tempo não volta para trás nem se repete. O trabalho que espera o CDS não é o de repetir fórmulas passadas. O que é preciso é retomar o ímpeto fundador do partido e trazê-lo para os nossos dias.

É preciso voltar a afirmar hoje com clareza o primado da dignidade da Vida Humana, em todas as circunstâncias, desde a concepção até à morte natural. E como consequência dessa dignidade o respeito pelas liberdades individuais: a liberdade de educação, a liberdade religiosa e política, a liberdade económica.

Mas também no respeito pela dignidade humana é preciso defender um Estado Social cooperativo, não centralista. Um Estado que serve as pessoas e que é garante do respeito pela sua dignidade. O CDS, como partido democrata-cristão, tem que ser o partido dos trabalhadores, dos pequenos e médios empresários, dos agricultores, das famílias. O partido que defende os mais fracos e indefesos. Não somos nem podemos ser um partido liberal, que coloca a liberdade acima da dignidade Humana.

Por fim, um Estado que se concebe como instrumento de uma sociedade, é um Estado que respeita a história, as tradições e a cultura da sociedade. Não se trata de um saudosismo bafiento, mas de um respeito por aquilo que nos une enquanto portugueses. Em nome de uma qualquer ideologia de vanguarda não podemos rasgar 900 anos de história.

Muitos dirão que isto é conversa que não interessa a ninguém, que as pessoas só querem saber de coisas concretas. Mas a verdade é que temos assistido cada vez mais à ascensão dos partidos que se apresentam com ideais (do PAN à IL) e que o pragmatismo deu 4% nas urnas.

O futuro não parece risonho para aqueles que acreditam numa política baseada na dignidade da Pessoa Humana. Num Estado ao serviço das pessoas e não da ideologia. Para as pessoas que desejam políticos ao serviço do ideal e não do resultado eleitoral. Mas a hora não é de cobardias nem de tibiezas. Nos próximos anos não se jogará apenas a sobrevivência do CDS, mas do regime democrático que está cada vez mais enlameado, cada vez mais afastado das pessoas, cada vez mais fragilizado.

O CDS, tal como há 40 anos, quando cercado no Palácio de Cristal e ameaçado pelos que não suportavam um partido de homens livres, tem que voltar a ser o partido do humanismo cristão, que se ergue contra a tirania do marxismo e o pântano do centrão. Haja coragem.

quinta-feira, 3 de outubro de 2019

Votar é preciso!





1. Em Portugal assiste-se a um desencanto cada vez maior com a política. São cada vez menos os que votam e os que votam fazem-nos de maneira cada vez mais desanimadas. Há muitas razões para que isto aconteça. A política parece cada vez mais distante da vida diária das pessoas, cada vez mais embrenhada em trincheiras partidárias. Os escândalos de corrupção e de abuso de poder parecem não acabar. Os políticos falam uma linguagem que só eles parecem entender, mais pensada para os comentadores e os outros políticos, do que para os cidadãos.

Contudo as razões que levam tantos a uma posição cínica diante da política, não são exclusivas da política. São fruto de uma sociedade cada vez mais distante da realidade, de uma humanidade cada vez mais desinteressada pela sua própria vida, pela dos seus filhos, pela dos seus amigos. A política é aquilo que a sociedade dela faz.

Temos a política que temos porque a maior parte de nós não se empenha nela. Para que a política mude é preciso o empenho de quem a quer mudar. E neste momento esse empenho significa dia 6 de Outubro ir votar.

2. A política vive da tensão entre o ideal e o real. Nós empenhamo-nos na política para servir o ideal. Contudo o ideal serve-se na realidade concreta. E a realidade nunca é como nós queremos, nunca é a melhor, é o que é.

Se só nos empenhamos na política quando estão reunidas todas as condições para se construir o que consideramos melhor, então nunca o faremos. Ficaremos encerrados na nossa trincheira, cheios de razão e superioridade moral, mas sem realmente construir nada.

Dia 6 de Outubro não somos chamados a votar nos candidatos perfeitos, com ideias justas e vidas privadas impolutas. Somos chamados a votar em quem aparece no boletim de voto. E o nosso trabalho é ajuizar como é que nosso voto pode ajudar a construir o bem comum.

Votar é escolher entre as possibilidades que existem, não entre as que nós queremos. Se nos refugiamos na nossa exigência moralista de candidatos perfeitos o único resultado será não termos qualquer voz na construção da nossa sociedade.

3. Estas eleições são dramáticas. Infelizmente, como tem vindo a ser habitual, muitas das questões essenciais têm ficado longe da campanha. Dia 6 de Outubro está em jogo:

- A possibilidade de aprovação da eutanásia, do alargamento dos prazos legais do aborto, do regresso das barrigas de aluguer;

- A ameaça à liberdade de educarmos os nossos filhos: mais ideologia de género nas escolas, mais perseguição às escolas não estatais, menos possibilidade de escolher a escola, mais centralismo do Ministério da Educação;

- Um Estado cada vez mais poderoso e centralizador, que chama a si todos os aspectos da vida social, desde a saúde à economia, passando pelo apoio social, reduzindo assim a possibilidade intervenção pessoal e das comunidade;

- A continuação da impunidade para os casos de corrupção e de abuso de poder.

4. Está nas mãos de cada um de nós tomar posição sobre estes temas. Cabe a cada um de nós escolher se queremos um Estado que respeita a dignidade humana, a sua liberdade, a sua consciência. O tempo é grave por isso não farei qualquer apelo partidário. Apenas apelo para que todos em consciência não fiquem na indiferença perante as eleições. Dia 6 é dia de escolher: dá trabalho,  mas a alternativa é deixar outros escolherem por nós.