Cara Clara,
Li com atenção a sua carta aberta a alguns políticos sobre a
ideologia de género. Bem sei que não sou nenhum dos destinatários da carta, nem
sequer possuo qualquer relevância – não ocupo qualquer cargo público, não tenho
coluna em qualquer jornal, nem sequer possuo esse título que alguns tanto
almejam de “influencer” –, mas fiquei incomodado com a sua carta e, por isso,
decidi responder-lhe.
Incomoda-me, e penso que é até bastante preocupante, que ao
fim de séculos de luta pela igual dignidade de cada pessoa, a Clara se refira a
um grupo de pessoas como “pessoas LGBT”. Bem sei que é uma tendência designar
pessoas por uma “identidade”, seja a sua sexualidade, a sua etnia ou o seu
estatuto económico.
Para mim, uma pessoa é isso mesmo: uma pessoa. Tenho, entre
os meus amigos e familiares, pessoas de diferentes etnias, religiões e que
vivem a sua sexualidade de forma diferente da minha. Nem por um momento me
ocorreria que essa diferença os definisse. O meu amor, o meu carinho, a minha
estima por uma pessoa não muda conforme a sua sexualidade. Reconheço em cada um
o mesmo desejo de amor, de justiça e de beleza que eu possuo.
Reduzir a pessoa a uma identidade é desumanizá-la; é tratar
essa pessoa, não de acordo com a sua dignidade intrínseca, mas definindo-a por
uma qualquer característica que a Clara ache relevante. No fundo, não é
diferente do racismo ou da xenofobia, onde a pessoa é reduzida à cor da sua
pele ou à sua nacionalidade.
A Clara parece considerar que a consequência normal diante
de alguém diferente é abandonar essa pessoa ou tratá-la mal. E provavelmente
acha que essa é a consequência porque defende que essa diferença define uma
pessoa (é LGBT, é trans, é “racializada”). Para mim, abandonar ou maltratar uma
pessoa diferente de mim é absurdo, porque essa diferença em nada muda a
dignidade ontológica do ser humano.
Por isso, a chantagem psicológica que tenta usar sobre quem
tem uma visão diferente da sua da sexualidade não me impressiona. Já me
preocupa bastante que queira impor a sua visão sobre a sexualidade a toda a
sociedade.
A teoria de género é uma teoria social que defende que o
género e o sexo são coisas diferentes, que o género é apenas uma construção
social e que, por isso, há tantos géneros quantos aqueles que as pessoas
inventarem. O facto de esta teoria estar muito difundida não a torna correcta.
Também houve alturas em que as teorias raciais estavam muito difundidas e não
passaram a ser correctas por causa disso.
A teoria de género faz tábua rasa da biologia, da história e
da sociologia para impor uma visão ideológica da identidade sexual. Mas a Clara
tem toda a liberdade de acreditar em tal teoria, que não vê qualquer problema
em que um homem, por se afirmar mulher, possa espancar uma mulher num ringue de
boxe ou violá-la numa cadeia. Não tem é o direito de a querer impor como
verdade única a toda a sociedade.
A Clara tenta explicar que não há uma ideologia de género,
só uma teoria. Isso só seria verdade se, de facto, fosse tratada apenas como
uma hipótese científica discutível. Mas não é isso que acontece. A teoria de
género tornou-se hoje numa ideologia oficial, que se impõe através de leis, às
escolas, às empresas e à sociedade em geral. Uma verdade de fé que não pode ser
negada, sob pena de punição.
Cara Clara, eu convivo muito bem com a diversidade. Não
tenho qualquer problema com quem pensa ou vive de forma diferente da minha.
Nunca reduzi ninguém à sua identidade sexual, procurando amar e respeitar
qualquer pessoa com quem me cruzo. Aquilo com que não convivo bem é com a
tentativa dos ideólogos do género de procurar reduzir pessoas à sua sexualidade
e de obrigar todo o mundo a pensar como eles. Há um de nós que não vive bem com
a diversidade, mas não me parece que seja eu…

Absolutamente perfeito. Subscrevo cada uma das suas palavras.
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