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terça-feira, 29 de abril de 2025

ALGUMAS COISA QUE APRENDI COM O APAGÃO

1. A primeira é que boa parte dos políticos prefere a imagem à substância. Não digo que tudo tenha corrido bem, mas a verdade é que, diante de um incidente bastante imprevisível e que criou grandes dificuldades, não houve caos. Os hospitais funcionaram, os autocarros funcionaram, a rádio funcionou, os serviços de urgência funcionaram. O apagão durou entre 6 e 12 horas, dependendo das zonas do país, o que, considerando que foi preciso reiniciar toda a rede elétrica nacional, não me parece dramático.
Houve informação durante todo o dia pelos meios disponíveis, sobretudo a rádio. Foram dadas as indicações necessárias (não criar caos, evitar deslocações, não açambarcar, telefonar para o 112, etc.). Percebo que muitos prefiram o estilo de Sánchez em Espanha, de estar constantemente a aparecer e a falar em público. Eu prefiro que o Governo trabalhe.
2. Quando finalmente recuperei a luz, percebi que alguns deputados do Chega passaram o seu dia, durante uma emergência nacional, a fazer vídeos nas redes sociais, a fazer acusações sem terem todos os factos. Pelo meio, aproveitaram para lançar meia dúzia de acusações infundadas, que serviam apenas para aumentar a indignação e, assim, ganhar pontos políticos. O Chega provou, mais uma vez, a sua (in)utilidade: fazer barulho enquanto outros trabalham.
3. Pedro Nuno Santos estava muito indignado porque a Proteção Civil não enviou um SMS durante o dia. Aparentemente, o candidato a primeiro-ministro queria que a Proteção Civil, em vez de trabalhar e comunicar pelos meios disponíveis – a rádio –, perdesse tempo com um meio de comunicação a que a esmagadora maioria do país não teve acesso. Mais uma vez, a forma em nome da substância. Conhecemos a fórmula durante a pandemia; espero que, no dia 18, os portugueses percebam que não é boa ideia repetir.
4. Impressiona-me a facilidade com que continuamos a cair na desinformação. Pensava que, nesta altura, já todos tínhamos percebido que correntes de prints e áudios no WhatsApp não são fonte de informação. Ontem ouvi e recebi de tudo: desde a Europa estar toda às escuras até submarinos russos nas nossas águas. Amigos, uma boa solução quando alguém envia uma informação dessas é confirmar nos meios de comunicação social antes de a espalhar.
5. O que leva ao próximo ponto: a importância dos órgãos de comunicação social. Quem acha que as redes sociais podem substituir os media recebeu ontem uma lição. Há uma crise de credibilidade dos media? Sim. Muito por culpa dos próprios? Sim. Mas a solução não é entregar a informação a ativistas do teclado – é lutar por melhores media.
6. Ontem ressurgiu o patriotismo energético. Pelos vistos, devíamos estar completamente isolados da rede europeia e depender apenas de nós próprios. Claro que isso é uma utopia – mas num dia de sol, num ano de muita chuva, é fácil falar. O problema é em anos de seca, no meio do inverno, num país que não produz carvão nem petróleo. Já nem falo do facto de os mesmos que pedem energia patriótica provavelmente serem os primeiros a resmungar com o aumento do preço da energia, caso nos isolássemos da rede europeia.
7. Impressiona-me pensar no muito que foi preciso fazer ontem – e que foi feito –, sem alarido e sem caos. Sobretudo o trabalho de reiniciar toda a rede elétrica. Não podemos deixar de estar agradecidos a todos os que, ontem, passaram o dia a trabalhar para garantir o mínimo de normalidade, assim como aos que trabalharam arduamente para que tudo voltasse ao normal.
8. Também vejo muito indignação por não se saber a causa. Ora, para ser exacto, nós sabemos a causa de ter falhado a energia em Portugal: o corte em Espanha. Não sabemos é o que é aconteceu em Espanha. Por isso, se querem resmungar, o melhor é fazê-lo com Pedro Sanchez, porque Luís Montenegro é primeiro-ministro só de Portugal.
9. Por fim: ontem ficou evidente o quanto estamos dependentes da eletricidade e, por isso, o quão fragilizados estamos. A minha geração, que vive no digital, ontem foi apanhada sem um tostão no bolso, sem um rádio em casa, e alguns sem qualquer forma de cozinhar. Sem querer soar apocalíptico, decidi ir comprar um rádio a pilhas, guardar o mínimo de dinheiro físico em casa e comprar mais umas lanternas.

Todas as reaçõ

quarta-feira, 23 de abril de 2025

A SANTA SÉ, O VATICANO E OS ANTICLERICAIS DE PACOTILHA

1. Sempre que surge alguma notícia relacionada com o Papa ou com a Igreja a nível mundial, começa a confusão entre o Vaticano e a Santa Sé. Uma confusão compreensível, mas, mesmo assim, evitável.
A Cidade do Vaticano foi criada pelos Acordos de Latrão, no século XX. Após a unificação de Itália, no século XIX, e o fim dos Estados Pontifícios, o Papa declarou-se prisioneiro no Vaticano, já que recusava a soberania o rei de Itália. O impasse foi resolvido com os Acordos de Latrão, que criaram um território independente, garantindo que o Santo Padre era independente de qualquer poder temporal. A Cidade do Vaticano é um Estado soberano sobre o qual a Santa Sé exerce autoridade plena. Mas não é com o Vaticano que os Estados mantêm relações diplomáticas, exceto em algumas pequenas questões burocráticas, como os correios ou os transportes.
2. A autoridade espiritual e governamental da Igreja é representada pela Santa Sé, que é Pessoa de Direito Internacional Público. O Papa não é chefe de Estado por ser o governante de um pequeno território no meio de Roma, mas por ser líder da Igreja. E, do ponto de vista das relações internacionais, essa relação é feita pela Santa Sé. Os núncios apostólicos não representam um micro-Estado, representam o Papa como seus embaixadores. É a Santa Sé que está representada na ONU e em várias outras organizações internacionais.
3. Enquanto o Vaticano não tem cem anos de existência, a Santa Sé tem vários séculos. Atualmente, a Santa Sé mantém relações diplomáticas com mais países do que qualquer Estado, e a sua diplomacia é famosa pela sua competência. Só no último século são vários os conflitos evitados ou terminados pela diplomacia da Santa Sé (pensemos, por exemplo, na guerra civil em Moçambique ou na importância da Igreja no processo de independência de Timor).
4. Durante séculos, na Europa, a Santa Sé era considerada o poder internacional mais importante. Era ao Papa e à Igreja que reis e governantes recorriam para resolver conflitos.
Foi por uma bula papal que Portugal se tornou oficialmente independente, e as relações diplomáticas entre o nosso país e a Santa Sé vêm desde a fundação até ao nosso tempo, com uns curtos interregnos pelo caminho. Antes de ter relações diplomáticas com Castela, antes da aliança com Inglaterra, Portugal já tinha relações diplomáticas com a Santa Sé. Razão pela qual o Núncio Apostólico em Portugal é o decano do corpo diplomático.
5. Em Portugal, quando morre um Chefe de Estado de um país com quem mantemos relações diplomáticas, a tradição é declarar três dias de luto. Ainda há pouco tempo foi assim com a Rainha Isabel II. O luto declarado pelo Governo pela morte do Papa Francisco não se trata, por isso, de um reconhecimento especial à Igreja, mas apenas da aplicação desse princípio. O Papa é o Chefe de Estado da Santa Sé, nós temos relações diplomáticas há quase novecentos anos com a Santa Sé, logo, fazemos luto quando morre o Papa. Seria igual para o rei de Espanha ou para o presidente de França.
Ao ver a indignação de tanto anticlerical com este luto, não consigo deixar de pensar como a ignorância é, de facto, muito atrevida. Não há qualquer problema em uma pessoa não ter qualquer conhecimento de Direito Internacional Público ou de Diplomacia. Mas é bastante vexatório ver pessoas a exibir com orgulho a sua ignorância, enchendo a boca com palavras redondas como “laicidade”, achando-se sábias no seu desconhecimento.
6. Dada a explicação formal, não posso, porém, deixar de acrescentar um ponto. A igualdade é tratar de forma igual o que é igual, e de forma desigual o que é desigual, na medida da sua desigualdade.
A Igreja é parte essencial da nossa história. Qualquer pessoa que percorra as nossas terras, visite igrejas, capelas, basílicas, santuários, mosteiros, conventos, consegue perceber o seu papel ímpar. E, ainda hoje, na vida cultural e educativa, a Igreja continua a ter um papel essencial. Sobretudo, a Igreja continua hoje a ser o porto seguro dos mais pobres, dos abandonados, dos desvalidos. A obra social da Igreja é o que separa milhares de pessoas em Portugal da miséria e da morte.

Reconhecer este facto não é um ataque à laicidade do Estado; pelo contrário, é não impor o ateísmo de alguns a todo um povo.1. Sempre que surge alguma notícia relacionada com o Papa ou com a Igreja a nível mundial, começa a confusão entre o Vaticano e a Santa Sé. Uma confusão compreensível, mas, mesmo assim, evitável.

A Cidade do Vaticano foi criada pelos Acordos de Latrão, no século XX. Após a unificação de Itália, no século XIX, e o fim dos Estados Pontifícios, o Papa declarou-se prisioneiro no Vaticano, já que recusava a soberania o rei de Itália. O impasse foi resolvido com os Acordos de Latrão, que criaram um território independente, garantindo que o Santo Padre era independente de qualquer poder temporal. A Cidade do Vaticano é um Estado soberano sobre o qual a Santa Sé exerce autoridade plena. Mas não é com o Vaticano que os Estados mantêm relações diplomáticas, exceto em algumas pequenas questões burocráticas, como os correios ou os transportes.
2. A autoridade espiritual e governamental da Igreja é representada pela Santa Sé, que é Pessoa de Direito Internacional Público. O Papa não é chefe de Estado por ser o governante de um pequeno território no meio de Roma, mas por ser líder da Igreja. E, do ponto de vista das relações internacionais, essa relação é feita pela Santa Sé. Os núncios apostólicos não representam um micro-Estado, representam o Papa como seus embaixadores. É a Santa Sé que está representada na ONU e em várias outras organizações internacionais.
3. Enquanto o Vaticano não tem cem anos de existência, a Santa Sé tem vários séculos. Atualmente, a Santa Sé mantém relações diplomáticas com mais países do que qualquer Estado, e a sua diplomacia é famosa pela sua competência. Só no último século são vários os conflitos evitados ou terminados pela diplomacia da Santa Sé (pensemos, por exemplo, na guerra civil em Moçambique ou na importância da Igreja no processo de independência de Timor).
4. Durante séculos, na Europa, a Santa Sé era considerada o poder internacional mais importante. Era ao Papa e à Igreja que reis e governantes recorriam para resolver conflitos.
Foi por uma bula papal que Portugal se tornou oficialmente independente, e as relações diplomáticas entre o nosso país e a Santa Sé vêm desde a fundação até ao nosso tempo, com uns curtos interregnos pelo caminho. Antes de ter relações diplomáticas com Castela, antes da aliança com Inglaterra, Portugal já tinha relações diplomáticas com a Santa Sé. Razão pela qual o Núncio Apostólico em Portugal é o decano do corpo diplomático.
5. Em Portugal, quando morre um Chefe de Estado de um país com quem mantemos relações diplomáticas, a tradição é declarar três dias de luto. Ainda há pouco tempo foi assim com a Rainha Isabel II. O luto declarado pelo Governo pela morte do Papa Francisco não se trata, por isso, de um reconhecimento especial à Igreja, mas apenas da aplicação desse princípio. O Papa é o Chefe de Estado da Santa Sé, nós temos relações diplomáticas há quase novecentos anos com a Santa Sé, logo, fazemos luto quando morre o Papa. Seria igual para o rei de Espanha ou para o presidente de França.
Ao ver a indignação de tanto anticlerical com este luto, não consigo deixar de pensar como a ignorância é, de facto, muito atrevida. Não há qualquer problema em uma pessoa não ter qualquer conhecimento de Direito Internacional Público ou de Diplomacia. Mas é bastante vexatório ver pessoas a exibir com orgulho a sua ignorância, enchendo a boca com palavras redondas como “laicidade”, achando-se sábias no seu desconhecimento.
6. Dada a explicação formal, não posso, porém, deixar de acrescentar um ponto. A igualdade é tratar de forma igual o que é igual, e de forma desigual o que é desigual, na medida da sua desigualdade.
A Igreja é parte essencial da nossa história. Qualquer pessoa que percorra as nossas terras, visite igrejas, capelas, basílicas, santuários, mosteiros, conventos, consegue perceber o seu papel ímpar. E, ainda hoje, na vida cultural e educativa, a Igreja continua a ter um papel essencial. Sobretudo, a Igreja continua hoje a ser o porto seguro dos mais pobres, dos abandonados, dos desvalidos. A obra social da Igreja é o que separa milhares de pessoas em Portugal da miséria e da morte.
Reconhecer este facto não é um ataque à laicidade do Estado; pelo contrário, é não impor o ateísmo de alguns a todo um povo.

segunda-feira, 21 de abril de 2025

Na morte do Papa Francisco



Morreu o Papa Francisco. Não tenho jeito, nem a pretensão, de fazer qualquer análise sobre o seu pontificado, para esse peditório já há gente a mais. Alguns bem informados e capazes, muitos que se ficarão pela rama e dirão disparates. Não me parece que tenha capacidade para fazer partes dos primeiros, por isso evito-me juntar aos segundos.

Mas impressiona-me muito que o Santo Padre, após o sofrimento que passou nesta Quaresma, morra na Segunda-Feira de Páscoa. À cabeça vem-me a frase de Nosso Senhor, «Desejei ardentemente comer convosco esta Páscoa antes de morrer.» (Lc., 21, 15). Com a sua doença e morte, de forma misteriosa, o Papa Francisco associou-se à Páscoa.

Guarda com comoção a chegada do Papa Francisco à nunciatura em Lisboa, no dia em que aterrou em Portugal. Lembro-me como, apesar do evidente cansaço, veio até junto daqueles que lá estávamos, para saudar e abençoar.

Agora segue-se um tempo misterioso, onde a Sé de Pedro está vazia. Muitos irão falar do Papa Francisco, mas falarão mais da sua ideia do Santo Padre, do que realmente do seu pontificado. Não irão faltar as análises, as intrigas sobre quem deverá ser o próximo Papa, com análises profundas, questões políticas, apostas. Tudo na ânsia de tentar descobrir aquilo que só o Espírito Santo conhece.

Peço para mim a graça de não cair nessa tentação. Sobre o Papa Francisco, peço ao Bom Deus que o receba na Sua Glória. Sobre o próximo Papa, rezo para que os senhores cardeais abram o seu coração ao Espírito Santo e escolham para a Cátedra Pedro quem o Senhor deseja.

Rezo sobretudo para que o Bom Deus me livre de ter opiniões sobre quem deve ser o próximo Papa. Para não esperar um pastor à minha medida, que caiba nas minhas limitações, na minha visão do mundo e da Igreja. Rezo para que Deus, mande à Sua Igreja o pastor que Ele deseja, e que a mim conceda a abertura de coração de amar o Papa, seja ele quem for.