Primeiro era só para os nascituros com risco de deficiência
e para aqueles que foram concebidos por violação. Por alguma razão, um bebé
deficiente tem menos valor que um saudável e um nascituro deve pagar pelos
pecados do seu pai. Depois era só para evitar que as mulheres fossem presas,
mesmo sabendo que não havia uma mulher presa por ter abortado há décadas. Agora
afinal é um direito fundamental da mulher, e o bebé é reduzido a uma coisa sem
qualquer direito, de tal forma que é preciso alargar os prazos do aborto legal,
para garantir que não há qualquer estorvo à possibilidade de eliminar uma vida
que não nasceu. Pelo meio, lembraram-se que afinal os doentes e idosos também
não têm a mesma dignidade que o resto das pessoas e por isso, quando pedem para
morrer, em vez de ser cuidados, devem levar uma injecção letal.
Esta loucura, e não tenho dúvidas que chegará o tempo onde a
história assim julgará esta cultura da morte, não começou em 2007, começou em
1984, quando se começou a legalizar o aborto. E não terminou aí, continua viva
ainda hoje. E assim irá continuar. Irá continuar porque é fruto de uma cultura
que já não reconhece o valor intrinsecamente sagrado da vida humana.
Hoje a Pessoa tem valor na medida em que a sociedade assim o
dita. Tem valor na medida em que tem utilidade prática ou afectiva para mim. Se
assim não for, não é bem vida, é uma coisa, já não tem dignidade. É esta porta,
da redução do outro à ideia que eu tenho sobre ele, que a legalização do aborto
abriu. Uma porta que, depois das tragédias do século XX, devia ter sido
fechada.
Não nos espantemos por isso que hoje se banalizem o discurso
de ódio contra imigrantes, minorias, adversários políticos. A partir do momento
em que o homem se fez Deus, e decidiu julgar ele em que momentos a vida humana
passa a ter direito a existir, nesse momento, abrimos a porta à redução do
outro a um objecto cujo valor sou eu que decido. É deficiente? Pode ser
abortado. Está doente? Pode ser morto. A sua vinda não dá jeito? Eliminamos. E
chamamos-lhe Direitos.
Dia 11 fez anos o referendo que tornou o aborto livre legal
em Portugal. Um pouco por todas as redes sociais vi festejos, como se uma
grande conquista se tratasse. Desde então mais de 230 mil crianças não
nasceram, pela mão do Estado. É isto que festejavam. Como pode o ódio não
triunfar numa sociedade que festeja a morte de centenas de milhares de crianças
por nascer?
O artigo podia ficar por aqui. A tentação de apontar o ódio
e ficar aí é grande. Mas a verdade é que é mesmo preciso responder é esta
pergunta: como, neste tempo onde se festeja a morte de crianças por nascer, é
possível não triunfar o ódio. E a resposta, não sendo fácil, é simples. Eu não
posso mudar a sociedade, mas posso mudar o meu coração. Não posso impedir que o
ódio cresça entre as pessoas, mas posso impedir que cresça em mim. Por isso
aquilo que posso fazer, que podemos todos fazer, é responder ao ódio com amor.
É diante de quem defende a cultura da morte, afirmar uma cultura de amor à
vida. Não há vida em abstracto, mas às vidas concretas das pessoas com quem me
cruzo.
Dia 29 de Março a Caminhada pela Vida sai à rua em 13
cidades do país. Um momento preferencial para dar testemunho da beleza da vida.
Para responder à cultura do ódio, com uma cultura de amor. Caminhamos não por
ódio, mas para dar testemunho de que a vida é sempre bela e pode, e deve ser
amada, em qualquer circunstância.
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