quinta-feira, 22 de maio de 2025

Adolescência, violência sexual e a falta do pais

  


  1. Nos últimos tempos as notícias sobre o aumento da violência, sobretudo a violência sexual, entre menores têm aumentado. Se não bastasse o sucesso da série Adolescência, a notícia da violação de uma menor por três influencers, assim como a notícia de que o número de abusos sexuais entre menores tem aumentado, trouxe o assunto para a ribalta.


Rapidamente vemos repetir os mesmos chavões: o machismo tóxico, o movimento incel, a extrema-direita, as redes sociais, etc. Eu confesso que a mim o que mais me choca é a incapacidade de compreender que estes fenómenos, que sem dúvida produzem violência sexual, não são a causa, mas sim a consequência de uma mentalidade dominante.

Vivemos num tempo dominado pelo individualismo. Estamos rodeados de mantras como “se não cuidares de ti, quem cuidará?”, “és responsável pela tua felicidade”, “não deixes que nada se interponha entre ti e os teus sonhos”. Todas as semanas somos brindados com reportagens que explicam a carga que significa ter filhos, ou cuidar dos pais envelhecidos, ou de companheiros doentes. As crianças são educadas a acreditar que são especiais, que merecem ser tratadas como tal e que o mundo tem o dever de se adaptar a elas.

Desta cultura não escapa, pelo contrário, a sexualidade. A cultura actual ensina que a sexualidade existe, antes de mais, para satisfação própria. Por isso é bom ver mulheres a prostituírem-se em frente a câmaras, é bom pagar para ter sexo, todas as fantasias são incentivadas (incluindo o maltrato a mulheres como forma de ter prazer, que dá direito a best-seller e a sucesso de bilheteira). No nosso tempo a satisfação dos desejos sexuais é uma prioridade e o sexo um direito.

Ora, é evidente que, se educamos assim as crianças, não nos podemos espantar que elas não se detenham diante de pormenores como a vontade do outro. Num mundo onde a objectivação das mulheres (na pornografia, na prostituição, nas redes sociais) é banalizada, por que razão nos espantamos quando os adolescentes e os jovens tratam as mulheres como objectos? Se consideramos normal ver vídeos de mulheres pagas para satisfazer tarados que fantasiam com violações, por que nos espantamos que miúdos de 13, 14, 15 anos não distingam quanto é real e quando é apenas ficção?

Mas pior do que isto, quando a sociedade diz que mulheres que oferecerem a sua intimidade a homens perversos que lhes podem pagar é empoderamento, e outras tretas destas, quando constantemente se reduz as mulheres a pedaços de carne para exibir, nas revistas, nos sites, nos filmes, nas telenovelas, o que estamos a dizer às menores que estão a ver? Que é bom e normal, e até dá direito a ser famosa, vender a sua intimidade.

Educar assim as crianças e depois ficar espantado que os abusos sexuais aumentem demonstra uma total incapacidade de compreender que os actos têm consequências. Como eu dizia, a masculinidade tóxica, a cultura incel, são apenas duas das várias consequências de uma cultura onde prima o individualismo e onde os caprichos são tratados como direitos. Mas a causa é a mentalidade dominante, individualista e egoísta.

  1. O artigo podia ficar por aqui. Mas existe outro ponto, referido em abundância, que não consigo deixar de notar. Falo da relação dos jovens com a internet em geral, e com as redes sociais em particular.

Nas últimas semanas ouvimos vezes sem conta falar da necessidade de regular a internet, as redes sociais, de proibir os telemóveis nas escolas. Mas há um ponto essencial, que me parece totalmente ausente do debate: por que razão um pai que abandonasse uma criança no meio de uma rua cheia de casas de alterne, violência e teóricos da conspiração perderia a guarda do filho, mas achamos normal que um pai dê um smartphone a uma criança? A comparação pode parecer um exagero, mas a verdade é que hoje através destes aparelhos as crianças estão expostas a um mundo que não compreendem, com fácil acesso a todo o tipo de informação, contactáveis por qualquer pessoa, com pouco ou nenhuma supervisão.

Evidentemente que os pais podem dizer que controlam o que os filhos vão vendo, mas é preciso ser muito ingénuo para acreditar que é possível controlar completamente o que um miúdo de 12 anos faz no seu telefone. O problema maior dos telemóveis não é o mal que as telas fazem (que também fazem), mas o facto de exporem os miúdos a um mundo para o qual não estão preparados.
Qual é a solução? Proibir o acesso dos miúdos a tecnologia? Impedi-los de ter acesso a uma ferramenta como a internet, essencial para o seu futuro? Desligá-los do mundo? Claro que não, por muito que, olhando para o mundo, possa parecer tentador!

Como dizia monsenhor Giussani, “educar é introduzir à realidade na totalidade dos seus factores”. É preciso acompanhar as crianças e adolescentes na introdução à internet, dar-lhes critérios, explicar-lhes os riscos, mostrar as potencialidades, e aguardar que tenham maturidade. É evidente que largar um rapaz a entrar na puberdade, com as hormonas em ebulição, mas ainda sem maturidade, numa realidade onde todas as perversidades estão ao alcance de uma pesquisa no Google, e onde são livres de as partilhar com os amigos (e com desconhecidos), é uma péssima ideia. É preciso acompanhá-los nessa aventura.

E isso depende, sobretudo, dos pais. Claro que a escola tem um papel importante na educação das crianças, mas de nada vale a escola controlar o uso dos telefones pelos miúdos, se, ao dar um passo para fora da escola, esse controlo desaparece. A resposta, por isso, a este flagelo não é responsabilizar as escolas, ou sequer as redes sociais, mas os pais, que têm de ser os protagonistas da educação dos filhos.

É duro ser o pai que nega aos filhos aquilo que os amigos todos têm. A pressão dos pares é uma coisa tramada, e contrariá-la dá muito trabalho. Mas é uma missão da qual os pais não se podem desmarcar. A liberdade dos miúdos é uma coisa tremenda, e é evidente que não podemos controlar. Mas temos o dever de os acompanhar enquanto crescem, para ter a certeza de que têm as ferramentas necessárias para enfrentar o mundo.

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