segunda-feira, 26 de junho de 2023

A escravatura do Orgulho

 


A direita-conservadora vive fixada nesse espantalho que é o marxismo-cultural. Ou seja, vive fixa na ideia de que uma filosofia falhada e derrotada no século XX é a principal ameaça cultural do nosso tempo.

Não digo que partes da teoria marxista, sobretudo a adaptação da luta de classes à luta interseccional, não influencie os grandes debates culturais do nosso tempo. Mas o problema mais dramático da cultura contemporânea não é o marxismo, mas o liberalismo individualista.

Vivemos hoje no primado do individualismo, onde o Homem é aquilo que diz sobre si mesmo, onde a realidade não interessa, apenas interessa aquilo que eu digo. Um tempo onde toda a sociedade tem de aceitar aquilo que eu digo sobre mim e tudo aquilo que se opõe à minha ideia sobre mim mesmo é uma agressão.

Isto é especialmente vivível na causa LGBT, que vai acrescentando sempre mais letras, de forma a acomodar cada vez mais “identidades”. O Homem passou a ser definido pelas suas atracões e pela sua sexualidade, deixando de ser filhos de Deus para ser filhos da moda, da sociedade, filhos de si mesmos.

E esta maneira de olhar para a sexualidade, centrado em si mesmo, afirmando que tudo o que me sacia sexualmente é válido (excepto o que for crime, então aí é preciso mudar a lei) e que qualquer opinião que diga o contrário é repressiva, é profundamente anti-humano. Esta visão da sexualidade, centrado apenas nos meus gostos e necessidades, significa reduzir o outro a um mero objecto de prazer. O individualismo reduz o próprio a uma criança mimada e o resto da humanidade a objectos que existem para o meu desfrute.

O resultado está à vista, apesar de toda as promessas de libertação sexual que há de trazer a felicidade à humanidade, finalmente livre de barreiras da moral, temos uma sociedade cada vez mais infeliz, cada vez mais incapaz de se relacionar, cada vez mais violenta, cada vez mais depressiva.

Por isso é especialmente preocupante ver a Igreja alinhar nesta mentalidade. A Igreja sempre afirmou com clareza que o Homem não é definido pelo seu pecado. O Homem foi criado para Deus, e é definido pela Graça de Deus. E por isso a Igreja a todos acolhe como Mãe, no convite contínuo a aderir a Cristo. Por isso a Igreja sempre falou com pessoas com tendências homossexuais, não permitindo que a sexualidade de uma pessoa a definisse.

Infelizmente, são cada vez mais os documentos que falam de pessoas LGBT (com mais ou menos letras), como se a sexualidade de uma pessoa definisse quem ela é. Como se de repente, houvesse uma classe à parte, diferente de pessoas, a quem o convite de Cristo a segui-lo não se aplicasse completamente, por causa da sua sexualidade.

Esta falsa misericórdia não é acolher ninguém, não é respeitar ninguém, pelo contrário, é reduzir pessoas iguais a mim a uma única dimensão da sua vida. No fundo, mesmo que não seja essa a intenção, é dizer que às pessoas com tendências homossexuais, ou que não se identifiquem com o seu sexo, de alguma forma, não lhes é oferecido o mesmo que é oferecido a mim.

Isto porque a moral sexual da Igreja não é um menos, não é uma obrigação, é uma graça. É uma forma mais Humana, mais bela, mais plena de se viver. Tratar uma pessoa apenas de acordo com o que diz sobre si, e não de acordo com aquilo que Deus diz sobre ela, é recusar a essa pessoa a dignidade de criatura de Deus. E isso não é dramático apenas para a sociedade, é dramático sobre para essas pessoas, a quem a Igreja recusa a Graça de Deus em troca de uma ideologia mundana.

 O mês de Junho, mês do Sagrado Coração de Jesus, mês dos Santos Populares, transformou-se no mês do Orgulho. E orgulho é o que mais define esta sociedade, onde o Homem recusa a paternidade Divina, e prefere-se criar à sua própria imagem e semelhança. O movimento LGBT não defende ninguém, nem promove qualquer igualdade, apenas ajuda a impor a escravatura do individualismo egoísta. Que o poder do mundo, vergado por esse individualismo, alinhe sem reserva nesse discurso não me espanta (embora me dê pena). Mas a Igreja tem o dever de ser Luz do Mundo, e de continuar a afirmar a Liberdade dos filhos de Deus num mundo de escravos do orgulho.

sexta-feira, 9 de junho de 2023

Em defesa da Europa Cristã

 


Ontem um homem sírio atacou crianças com uma faca num parque infantil em França. Um acto tão cobarde e monstruoso como este não pode deixar de revoltar qualquer um. Atacar crianças é a maior perfídia que consigo imaginar.

Este ataque voltou a levantar a questão da migração em massa de África e do Próximo Oriente para a Europa. Em Portugal o Chega já fez questão de alertar para o perigo que todas as crianças correm em todos os parques infantis por causa da imigração em massa.

Eu também concordo que a política de imigração da União Europeia é má. Má não apenas para os países europeus, mas também injusta para os imigrantes, que acabam na maioria das vezes abandonados e explorados nos países que os recebem. E também acho que há uma falta de clareza na diferença entre migrantes e refugiados. Pior, a União Europeia aposta numa falsa política de portas abertas, que ajuda a alimentar redes de tráfico e máfias, sem ter capacidade de dar respostas às pobres almas que procuram refúgio na Europa. E o resultado está à vista no cemitério em que se transformou o Mediterrâneo e no inferno em que Lesbos se tornou.

Por isso, se a política da extrema-esquerda, das falsas portas abertas, que só conduzem à miséria e à revolta dos migrantes, é uma ilusão, a resposta da extrema-direita, de tornar a Europa numa fortaleza fechada, também não me satisfaz. Porque em nome de uma falsa segurança das crianças europeias, estão dispostos a deixar morrer crianças não europeias no fundo do mar, ou às mãos de senhores da guerra, ou exploradas por uma qualquer máfia. A preocupação da extrema-direita não é com as crianças, nem com as mulheres, nem com os homens. A preocupação da extrema-direita é apenas com as pessoas da cor certa.

E pelo crime de um, querem fazer pagar milhões. Porque não exigem de facto uma resposta ao drama que hoje se vive nas rotas do Mediterrâneo, um negócio alimentado por máfias e senhores da guerra, à custa de milhões de inocente. Não pedem um combate eficaz ao tráfico humano, políticas de apoio ao desenvolvimento dos países de origem, campos de refugiados em condições, políticas eficazes de emigração. Só querem culpar um inimigo externo, demonizá-lo, e unir as massas à sua volta. Ou seja, querem força eleitoral, à custa de uma multidão de pobres e explorados.

Recuso que o preço da minha segurança seja a morte de milhares de crianças, só porque nasceram no continente errado. Sim, a Europa tem que encontra respostas a esta crise, mas não à custa de inocentes cujo único crime foi nascer no país errado.

Parte da extrema-direita vocifera contra os migrantes e refugiados em nome dos valores cristãos. Ignorando que se o primeiro mandamento é amar a Deus sobre todas as coisas, o segundo é em tudo igual a este: amar o próximo como a ti mesmo.

Uma Europa fechada sobre si mesmo, afogando-se na riqueza criada pela exploração do resto do mundo, uma Europa que ignora o grito de desespero vindo de África e do Próximo Oriente, será muitas coisas. Será herdeira de Roma e de Atenas. Será herdeira do Alemanha pura e da União das Repúblicas Soviéticas. Aquilo que não é seguramente, é cristã.

Dou graças a Deus por nascido na segurança e na abundância da Europa. E ainda mais agradecido por ter nascido numa sociedade herdeira do cristianismo. Sei bem que isso comporta riscos, mesmo assim incomparáveis a atravessar o Mediterrâneo num bote de plástico. E não estou disposto a abdicar desta herança por uma falsa sensação de segurança.

sábado, 3 de junho de 2023

Padre João Seabra - "Resta-me a minha vida dada a Deus."



Faz hoje um ano que o Senhor chamou a si o Padre João Seabra. Tive a graça de o poder acompanhar toda a minha vida. Com a sua pregação, com os seus conselhos, com os seus ralhetes, com a sua caridade, enfim, com toda a sua paternidade aprendi a amar a Cristo e à Igreja.

De todas as maravilhas de que fui testemunha por ter a graça de estar perto do Padre João, o que mais me comoveu e edificou foi a forma como viveu os seus últimos anos, os anos da doença.

Porque na sua doença confirmou de maneira clara aquilo que foi toda a sua vida. Quando as forças lhe começaram a faltar, quando a voz desapareceu, deixou de conseguir de ser o pregador exímio, o professor que ensina com autoridade, o mestre que corrige com exigência, o construtor de igrejas e de escolas, o trabalhador imparável da vinha do Senhor. Mas foi sempre o Bom Pastor, que dava a vida pelas suas ovelhas. Como São Pedro: “quando eras novo, tu mesmo te arranjavas e ias para onde querias. Mas quando fores velho, estenderás os braços, outro te há de vestir e levar para onde não queres.”

Quando a doença o despiu de todas as glórias mundanas, brilhou de forma ainda claro a única coisa que realmente lhe interessava: Cristo! Na sua doença a glória do mundo foi-se desvanecendo, mas a Glória de Deus brilhou de forma cada vez mais clara. O Senhor deu-lhe a sua cruz, e ele, como bom discípulo do Seu mestre, subiu à cruz com alegria.

Como afirmava o Padre João na sua última homília na Paróquia da Encarnação:

«Então o que é que me resta?
Resta-me a minha vida dada a Deus.
Como no primeiro instante.
A minha vida dada a Deus, para que Ele disponha.
Para que a utilidade a atribua Ele
e não a minha interpretação de mim próprio,
nem a ideia que os outros fazem de mim.
Mas Ele.
Na utilidade da vida que não tem outro propósito senão servi-lo
e oferecer-se por Ele
e dar-se por Ele.
Como Ele fez por mim.»

Que o Padre João, junto de Deus e de Sua Mãe, que tanto amou, continue a guiar o povo que o Pai lhe confiou.