1. Tenho
mantido neste jornal um acesso debate com Laura Ferreira dos Santos e com João
Ribeiro Santos sobre a questão da morte a pedido. Infelizmente temos perdido
muito espaço em questões laterais em vez de focar-mos o debate no essencial.
Peço por isso desculpa, mas não farei uma introdução descrevendo tudo o que foi
dito até aqui. Sobretudo, porque me vejo, mais uma vez, obrigado a insistir nos
pontos que constituem o cerne da petição e dos meus dois artigos anteriores e
para os quais ainda não recebi resposta.
2. Diz
Laura Ferreira dos Santos no seu último artigo que " Por acaso terá ouvido
algum de nós dizer que o Estado devia determinar a dignidade ou não de uma vida
humana?". De facto, não ouvi ou li tal afirmação da parte de nenhum dos
defensores da eutanásia. Contudo, é a consequência lógica de se defender a
legalização do homicídio a pedido da vítima e do suicídio assistido.
3.
Digo isto porque não acredito que os peticionários do Direito a Morrer com
Dignidade defendam a simples liberalização do homicídio a pedido da vítima e do
suicídio assistido. Não acredito que defendem que o Estado tem o dever de
autorizar e eventualmente executar a morte de qualquer pessoa que o peça.
Duvido seriamente que defendam que deixe de ser crime matar alguém ou ajuda-la
a cometer suicídio desde que se faça prova que a vítima o pediu.
4. Acredito que aquilo que defendem é que em
certas circunstâncias (quando existe grande sofrimento e um pedido expresso)
possa e deva o Estado autorizar a que se ponha fim à vida de uma pessoa.
5.
Ora, isto significa duas coisas: primeiro que é o Estado que define, através da
legislação, quem pode recorrer ao homicídio a pedido da vítima e ao suicídio
assistido. Segundo que será o Estado, através do mecanismo que for criado para
fiscalizar a aplicação desta lei, a decidir em que casos concretos pode e deve
esta ser aplicada.
6. É
evidente que o pedido será da pessoa que quer morrer. E que esta pode sempre
mudar de ideias. Contudo, quem decide se de facto aquela pessoa pode morrer é o
Estado. De facto não será suficiente a vontade expressa de morrer, será sempre
necessário:
a)
que se preencham os requisitos legais;
b) o
consentimento do Estado.
7.
Existe ainda outro ponto essencial da intervenção do Estado: tendo autorizado o
homicídio a pedido da vítima ou o suicídio assistido, caberá naturalmente ao
Estado executa-lo, através de profissionais de saúde devidamente autorizados e
capacitados. Não está em discussão uma simples autorização administrativa do
suicídio ou do homicídio. O debate não é sobre se o Estado pode ou não permitir
que um cidadão se mate. Mas sim, se o Estado pode, ou pior se está obrigado, a
conceder os meios para por termo à vida de um ser humano.
8.
Por tudo isto é que continuamos a insistir que o centro desta discussão não é a
autonomia pessoal. Não estamos a discutir a licitude do suicídio. Já todos
sabemos que a Laura Ferreira dos Santos e o João Ribeiro Santos consideram que
cada um tem direito a por fim à sua vida. Mas aquilo que realmente interessa é
saber se consideram que:
a) O
Estado pode decidir (dentro dos parâmetros acima descritos) que vidas têm ou
não dignidade?
b) O
Estado deve promover a morte dos cidadãos que queiram por termo à sua vida?
9.
Estas são as duas questões que temos colocado desde o principio do debate.
Estas são as duas questões para as quais ainda não obtivemos resposta.
José Maria Seabra Duque
Subscritor da Petição Toda a
Vida Tem Dignidade
Jurista
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