sábado, 28 de dezembro de 2019

O ataque à Porta dos Fundos e a indignação selectiva.




Assisto com espanto às reacções de consternação ao ataque feito ao Porta dos Fundos. Tenho lido por aí comparações várias ao terrorismo islâmico, ao Charlie Hebdo, até cheguei a ler um texto onde se explicava que era um ataque a quem só queria unir todos através do humor.

É preciso ser claro: é evidente que o especial de Natal dos humoristas brasileiros não justifica o uso de violência. Mas também é preciso ter sentido das proporções e não confundir o arremesso de dois cocktails molotovs a um edifico vazio por um grupo integralista político, com o terrorismo islâmico, e ainda menos com o ataque feito ao Charlie Hebdo, onde os atacantes tinham o objectivo claro de matar.

Nem a Porta dos Fundos passou de repente a ser uma pobre vítima. Os humoristas brasileiros decidiram fazer um especial de Natal com o único objectivo de causar polémica, sabendo que assim teriam sucesso. E decidiram causar polémica escarnecendo da fé dos cristãos. O seu objectivo não foi fazer humor, foi mesmo ofender, certos de que as respostas a este especial, tantas vezes desproporcionadas, seriam suficientes para lhes garantir o sucesso.

E assim foi. Este filme não tem sucesso graças a qualquer mérito próprio, mas só pela polémica que gerou. Infelizmente desta vez a indignação foi longe de mais.

Mas assim como não tenho qualquer problema em condenar quem atacou de forma irresponsável a Porta dos Fundos, também não tenho qualquer problema em condenar quem usa o ódio para se promover.

É das coisas mais espantosas tomar consciência que no tempo em que Bernardo Silva é condenado por fazer uma graça com um amigo africano, em que carreiras são destruídas por graçolas machistas com vinte anos, num tempo onde a linguagem é controlada ao pormenor de modo a não ofender nenhuma minoria, não exista qualquer pudor em zombar com a fé de tantos milhões de pessoas, sobretudo quando centenas de milhares de cristãos são perseguidos, e alguns até mortos, por professarem a sua fé.

A Porta dos Fundos decidiu achincalhar da fé daqueles que são mortos na Nigéria, presos na China, silenciados no mundo Árabe. E não só não foi censurada pelos habituais inquisidores contemporâneos, como aqueles que legitimamente se revoltaram com o filme foram, esses sim, considerados como inimigos da liberdade.

É aliás extraordinário como um cocktail molotov contra um prédio vazio causa bastante mais comoção do que crianças mortas na Síria ou na Nigéria.

Eu não tenho qualquer problema em condenar o ataque à Porta dos Fundos. Mas não tenho paciência para a indignação selectiva, que censura graças com homossexuais, mas se ri com as ofensas aos cristãos, que se indigna com o ataque sem qualquer vítima no Brasil, mas que olha para o lado quando milhares de cristãos são mortos pelo mundo fora.

Espero que de futuro aqueles que se dizem cristãos saibam responder a este género de demonstrações de desprezo e ódio dando testemunho da caridade cristã. Mas também fico à espera que todos os indignados profissionais, que hoje tanto defendem a Porta dos Fundos, demonstrem a mesma indignação da próxima vez que um cristão for morto pela sua fé. E sobretudo, espero que os humoristas brasileiros, que aproveitaram este episódio para se vitimizar, abandonem o discurso de ódio e ataque a quem só quer viver a sua fé sem ser insultado.

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