quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

O Eu diante da Crise.


QUARTA-FEIRA, DEZEMBRO 15, 2010


A actual crise tem dado azo a vários ataques ao sistema capitalista. Muitos defendem que se houvesse mais regulação nunca teríamos chegado a este estado. De facto a banca criou um mundo de riqueza imaginária que vivia completamente da confiança. Quando a crise começou muita desta riqueza simplesmente evaporou-se, deixando apenas um rasto miséria.

Os defensores da falência do capitalismo tendem a defender o socialismo, ou seja, uma economia mais controlada pelo Estado, que se encarregaria de distribuir melhor a riqueza criando assim igualdade social.

Esta ideia tem, do meu ponto de vista, dois grandes problemas. O primeiro é que o Estado só tem uma fonte de receita: os contribuintes. Ora, para o Estado criar igualdade social precisa de dinheiro. Dinheiro esse que vai buscar à nossa algibeira. Mas se o Estado vai taxando cada vez mais os contribuintes chega a um ponto onde já não há nada para taxar. Se o Estado cobrar impostos demasiados altos as empresas deixam de ter lucro, vão à falência, as pessoas deixam de ter emprego, deixam de ter rendimento e por isso deixam de consumir. De uma penada acabou-se o IRC, o IRS o IVA e a Segurança Social. Este facto faz com que o sistema tenha um prazo de validade no fim do qual ou se transforma (como a China) ou vai à falência (como aconteceu no Bloco Soviético).

O segundo problema é que a vida é naturalmente desigual: existem pessoas com mais capacidades do que outras. Se o Estado tentar que todos sejam iguais (como não pode tornar mais capazes os incapazes) resta-lhe uma solução: nacionalizar a riqueza e distribui-la igualmente por todos.

O problema deste sistema, de resto já tentado sem sucesso na URSS e na China, é que nesse caso uma pessoa não tem razão para trabalhar. Se é indiferente trabalhar ou não, porque esse facto é indiferente para o que eu ganho, então é melhor não fazer nada. O resultado é que fica pouca coisa para distribuir. Cria-se a igualdade, todos são pobres.

Parece-me que o problema do socialismo é que, embora ideologicamente possa funcionar, na realidade não. Não funciona porque as pessoas não são uma massa amorfa mas seres conscientes que desejam, antes de mais, ser livres.

Já o problema do capitalismo é outro. Não um problema do sistema, mas de cada pessoa: a liberdade humana mal usada.

A crise instalou-se porque as pessoas começaram a gastar o que não tinham. E os bancos continuaram a financiar essa loucura, criando riqueza da ausência dela mesma. O drama do capitalismo não está no sistema, mas no facto de os seus actores (ou seja todos nós) sermos livres para usar mal o dinheiro.

A culpa não é de um sistema abstracto, mas de pessoas concretas: dos banqueiros e empresários que na procura desenfreada de lucros perderam fortunas; de todos nós que gastamos o que não tínhamos e agora ficámos sem nada.

Claro que o capitalismo não é perfeito. O capitalismo puro e duro, onde o Estado não intervém, conduz à exploração do homem pelo homem. O Estado tem por isso que garantir que os mais pobres não sejam explorados pelos mais ricos. Ou seja, garantir o primado do Direito.

Para além disso, um Estado civilizado tem que garantir que cada pessoa tenha acesso ao mínimo do que precisa para um existência digna: casa, educação, saúde. Por isso é que são precisos os impostos. Estes são, para aqueles que pagam mais ao Estado do que os serviços que recebem deste, o preço que pagam por viver em sociedade. De resto deve dar liberdade para que cada use as suas capacidades como achar melhor.

Claro que este sistema cria desigualdades. Mas, citando Winston S. Churchill:
"The inherent vice of capitalism is the unequal sharing of blessings; the inherent virtue of socialism is the equal sharing of miseries".

Temos por isso duas opções: queixarmo-nos e barafustar contra o sistema, responsabilizando-o pelo crise e pedir ao Estado que resolva a crise ou tomarmos a sério o desafio que ela nos coloca: chamar-nos à responsabilidade no modo como usamos os nossos dons.

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Ética institucional.


A Ministra da Saúde disse hoje que "era importante que a Igreja esclarecesse qual a sua posição" sobre o preservativo. Esta declaração foi feita na apresentação de um livro sobre a SIDA, no âmbito do Dia Mundial contra a SIDA.

Esta declaração da Dra. Ana Jorge demonstra uma de duas coisas: ou uma grande falta de conhecimento ou demagogia barata. A posição da Igreja sobre o preservativo é sobejamente conhecida. Se é admissível que alguns mentes mais frágeis se tenham confundido pelo escareceu feito pela comunicação social sobre o livro do Papa, já não o é que a ministra da Saúde também se confunda. Mas caso de facto esteja confusa tem uma boa solução: perguntar! Pode pedir ao Senhor Patriarca que lhe explique, ou ao presidente da Conferência Episcopal Portuguesa ou muito simplesmente ao prior da sua paróquia.

Fazer esta declaração parece ser apenas demagogia barata. Demagogia essa sempre condenável num assunto sério como este, ainda mais quando feita pela responsável máxima pela saúde no nosso país.

E isto leva-me a uma segunda questão. Estas declarações são muitos graves. Porque de facto não se trata de uma simples cidadã a demonstrar a sua pouca inteligência ou a sua demagogia, mas de um membro de um governo que se arroga no direito de pedir satisfação à Igreja. Se tem opiniões pessoais sobre a Igreja, que as dê pessoalmente a quem de direito. Quanto fala à imprensa representa o Governo e o Governo não tem que pedir satisfações à Igreja sobre a sua doutrina.